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O desafio da CLT, aos 70 anos

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Por Redação
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Ao completar 70 anos de vigência, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) enfrenta o desafio de modernizar-se. Ela precisa mudar não para suprimir direitos e proteções dos trabalhadores - como afirmam dirigentes sindicais sempre que tratam do tema -, mas para estender suas regras a milhões de trabalhadores esquecidos por ela e por esses sindicalistas e para adaptar suas normas a um mundo do trabalho cujas características são muito diversas das do tempo em que ela foi concebida. Apesar das emendas que recebeu, a Consolidação das Leis do Trabalho tornou-se anacrônica. A alguns vícios de origem, acrescentou outros, que a tornam excessivamente rígida, tolhendo as relações entre empregados e empregadores e impedindo sua modernização.Não se trata de ignorar os efeitos benéficos para os trabalhadores que ela já produziu. A CLT cumpriu o papel que lhe atribuiu a ditadura varguista do Estado Novo, quando a colocou em vigor em 1.º de maio de 1943, de proteger os trabalhadores que tinham poucas condições de negociação com os empregadores. É com base na CLT que, bem ou mal, trabalhadores e empregadores vêm conseguindo, na maioria das ocasiões, equilibrar seus interesses, não raro conflitantes.Criada quando se iniciava a industrialização do Brasil e resultado da combinação de leis da década de 1930, a CLT, no entanto, não acompanhou as transformações da economia brasileira, nem, muito menos, do mundo do trabalho, causadas pelo notável avanço tecnológico das últimas décadas. Embora a maioria dos trabalhadores ainda mantenha vínculos empregatícios tradicionais, é crescente o número dos que desempenham suas funções de maneira diferenciada, em termos de jornada e local de trabalho, formas de relacionamento com a empresa contratante, regras para apresentação dos resultados do trabalho, o uso ou não de equipamentos fornecidos pela empresa, entre outros. Cresce também o número de profissionais que trabalham de modo diferenciado. São engenheiros, advogados, especialistas em tecnologia de informação, entre outros. Mas essas novas formas de trabalho não estão previstas na legislação.A exacerbação de algumas das características originais da CLT transformou-a, em certos casos, em elemento perturbador das relações entre trabalhadores e empresas que, na concepção de seus criadores, deveria melhorar. O paternalismo implícito na proteção aos menos capazes de se defender tornou-se a principal característica da legislação trabalhista.Além de excessivamente detalhista, em seus 922 artigos, a CLT é intervencionista, ao impedir, por exemplo, que patrões e empregados negociem livremente e estabeleçam condições de trabalho que considerem as mais convenientes para as duas partes, mas que não estão previstas em lei.Dirigentes empresariais e sindicais insistem, com razão, que a negociação coletiva é o caminho mais adequado para escapar da rigidez da legislação e adequá-la às especificidades da atividade empresarial. Mas com frequência aquilo que as duas partes negociaram - como a redução do horário de almoço, com a contrapartida do encerramento mais cedo do expediente - é rejeitado por decisão da Justiça do Trabalho baseada na CLT.Dos vícios antigos, mantém-se a cobrança do imposto sindical, com outro nome, equivalente a um dia do salário de todo trabalhador registrado. Esse dinheiro é distribuído para sindicatos, federações, confederações e centrais sindicais, que, em sua grande maioria, continuam sendo sustentados apenas com o imposto. Desse modo, essas entidades não precisam se preocupar com os problemas de suas bases.Talvez o que melhor retrate a necessidade de mudança da CLT seja o fato de que, passados 70 anos de sua criação, ainda existam 18,6 milhões de trabalhadores que não contam com a proteção da lei. Entre os fatores que estimulam a informalidade no mercado de trabalho estão o rigor, o detalhismo e a inadequação das regras da Consolidação das Leis do Trabalho à realidade econômica do País.