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O drama da violência

Em 2016, foram registradas 61.619 mortes violentas – um aumento de 4,7% em relação a 2015

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Por Redação
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Divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), uma organização sem fins lucrativos especializada na análise de dados solicitados ao Ministério da Justiça, às Secretarias de Segurança e às Polícias Civil e Militar dos Estados com base na Lei de Acesso à Informação, o mais novo mapa da violência do País mostra que o quadro da criminalidade está cada vez mais sombrio e que as taxas de morte violenta vêm batendo recordes.

Criado pelo FBSP para padronizar dados, o conceito de morte violenta engloba não só homicídios, mas, igualmente, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais. Em 2016, foram registradas 61.619 mortes violentas – um aumento de 4,7% em relação a 2015. Segundo o levantamento, a taxa nacional média de mortes violentas passou de 27,8 por grupo de 100 mil habitantes, em 2013, para 29,9, em 2015. Os Estados que registraram as maiores taxas são Sergipe (64), Rio Grande do Norte (56,9) e Alagoas (55,9), situados no Nordeste, revelando que a violência já não é mais exclusiva dos Estados mais desenvolvidos e populosos da Região Sul. O levantamento também mostra que as principais vítimas de mortes violentas são negros e jovens.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quando a taxa de homicídios é superior a 10 vítimas fatais por grupo de 100 mil habitantes, a violência é epidêmica. Entre 2014 e 2015, o número de homicídios passou de 56.337 para 58.383. Classificando o cenário da segurança pública como “trágico” e “obsceno” e apontando aumentos significativos não só de homicídios, mas em quase todos os indicadores nacionais de criminalidade, como latrocínios, estupros e crimes contra o patrimônio, o estudo do FBSP foi além dos levantamentos da OMS. “Os números só são comparáveis a grandes tragédias”, afirma o presidente da entidade, Renato Lima.

A ampla gama de fatores responsáveis por essa situação trágica é conhecida. O estudo do FBSP destaca a recessão econômica, que restringiu o orçamento dos Estados e os investimentos da União. O total gasto em segurança pública por governos estaduais e federal foi de R$ 81 bilhões – cerca de 3% a menos do que em 2015. Também afirma que o Plano Nacional de Segurança Pública – lançado em janeiro deste ano, como resposta aos massacres em prisões – vem sendo implantado de modo lento e que só teve a adesão de 12 Estados. Mais preocupados em garantir dividendos de curto prazo do que em investir em políticas de médio e longo prazos, os dirigentes dos demais Estados limitaram-se a recorrer à Força Nacional de Segurança Pública, coordenada pelo governo federal. Além de só produzir resultado paliativo, a Força Nacional custa caro – em 2016, ela consumiu R$ 319,7 milhões, ante R$ 184 milhões em 2015. O estudo critica ainda a má qualidade dos sistemas de informações, alegando que as áreas da segurança e Justiça vivem um “apagão estatístico”.

Ao lado desses fatores, que propiciam o aumento da violência, há problemas não menos graves, mas que não têm sido suficientemente discutidos, como a desagregação da família e a má qualidade do sistema educacional. Famílias estruturadas com base em valores morais são fundamentais para que as novas gerações aprendam com seus pais as noções de disciplina e sociabilidade. Escolas capazes de formar essas gerações, ensinando ética, respeito ao próximo, solidariedade e cidadania, são decisivas para que a sociedade brasileira se torne mais civilizada e justa. Família e escola são os ambientes propícios para ajudar a enfrentar uma crise de segurança que decorre não só de fatores econômicos, mas também da perda de padrões éticos – face ao consumismo e ao hedonismo que empobreceram espiritualmente as novas gerações. Se é preciso melhorar a qualidade de vida das pessoas, para deixá-las menos expostas à “gramática” do crime, como disseram respeitados especialistas que analisaram o estudo do FBSP, também é necessário lembrar onde esse triste cenário de criminalidade pode começar a ser revertido – em casa e na escola.