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O duplo desafio de Obama

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Por Redação
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Conforme o lugar-comum, o presidente dos Estados Unidos é o homem mais poderoso do mundo. Vá-se dizer isso ao primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, e ao presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad. Um lidera o que é considerado o governo mais direitista de Israel em décadas, declaradamente contrário ao estabelecimento de um Estado palestino na Cisjordânia e na Faixa de Gaza - a solução para o conflito no Oriente Médio encampada pela comunidade internacional, incluídos os países árabes, e com a qual Israel se havia comprometido em 1993. O outro, chefe do governo de uma teocracia, prega o fim de Israel e se recusa a suspender o programa de enriquecimento de urânio que dará ao país condições de fabricar um artefato nuclear - o que Israel pretende impedir pela força, na certeza de que nada induzirá Teerã a desistir do projeto. A negativa de Netanyahu tem o apoio da maioria dos seus concidadãos. Uma pesquisa recente revelou que 53% deles consideram a Cisjordânia território israelense libertado. A intransigência de Ahmadinejad é compartilhada pela esmagadora maioria dos iranianos e por seja lá quem o derrote nas eleições presidenciais de junho: o domínio da energia nuclear é questão de honra nacional. Barack Obama assumiu a Casa Branca com uma nova visão da política dos Estados Unidos para a esfera árabe-islâmica. Ele entende que a defesa do interesse americano nessa área mais crítica do globo exige uma interlocução talvez sem precedentes com os seus governos e sociedades - que passa, de um lado, por uma perceptível mudança de atitude de Washington diante da questão palestina e, de outro, pelo degelo das relações com o Irã. Nessa concepção, os Estados Unidos finalmente assumiriam o papel de "corretor honesto" que deles os países árabes cobram de há muito para a pacificação do Oriente Médio. Com isso se credenciariam a persuadir o Irã a renunciar ao controle do ciclo do combustível nuclear, em troca de comércio, investimentos, tecnologia - e garantias formais de incolumidade da República Islâmica, arquivada a retórica bushista da "mudança de regime" em Teerã. Se a diplomacia fracassar, diz Obama, "outros passos" seriam dados. Terá ele condições de dobrar israelenses e iranianos? O seu leque de opções em relação aos primeiros é claramente mais restrito. O novo chanceler israelense, Avigdor Lieberman, se gaba de que os Estados Unidos "aceitam todas as decisões israelenses". De fato tem sido assim, apesar do endosso de Washington à fórmula dos dois Estados e das suas críticas eventuais à expansão das colônias judaicas na Cisjordânia. Na segunda-feira, depois de duas horas de conversa com Netanyahu na Casa Branca, a primeira desde que ambos assumiram, Obama reiterou ambas as posições diante dos jornalistas. Mas o primeiro-ministro não lhe concedeu nem sequer a cortesia de fazer uma alusão, vaga que fosse, a um Estado palestino. Ele fala numa "paz econômica", a depender de negociações que seriam retomadas se o outro lado atender a uma nova precondição - reconhecer Israel como Estado judaico (o que o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, que aceita o Estado laico israelense, já considerou inaceitável). Em compensação, pela primeira vez Obama fixou um prazo para o Irã mostrar "um esforço de boa-fé para resolver as diferenças" com os Estados Unidos: o fim deste ano. "Não ficaremos conversando para sempre", advertiu. Em tese, ele poderia dizer o mesmo do interminável "processo de paz" na Palestina, cujo marco inaugural são os Acordos de Oslo de 1993 assinados por Yitzhak Rabin e Yasser Arafat. Desde o assassínio de Rabin por um estudante judeu de extrema-direita, dois anos depois, sucessivos governos israelenses, a um pretexto ou outro, foram adiando para as calendas a implementação dos acordos, enquanto expandiam os assentamentos nos territórios ocupados. Mas, ainda que Obama quisesse pagar para ver até onde Netanyahu insistiria em negar aos palestinos o seu Estado - embora disso dependa o "new deal" que planeja oferecer ao mundo árabe-muçulmano e que anunciará em grande estilo no Cairo no próximo dia 4 -, o presidente não teria o apoio nem do seu partido, nem do Congresso, nem da imprensa e nem da opinião pública americana. Já se endurecer com o Irã, terá a América inteira de seu lado.