Imagem ex-librisOpinião do Estadão

O FMI e o tsunami

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A presidente Dilma Rousseff continua acusando os bancos centrais da Europa e dos Estados Unidos de causar um tsunami monetário e provocar, com isso, uma perigosa valorização do real, derrubando o poder de competição dos produtores brasileiros. Esse persistente protesto causa pouca ou nenhuma impressão no FMI, o mais importante foro global de política econômica. É preciso atribuir aquela valorização a outras causas, segundo disse a diretora do Fundo, Christine Lagarde, em entrevista ao Estado. Os elevados juros brasileiros, o gasto público excessivo e as oportunidades de lucro maior do que em muitos outros países são importantes fatores de atração de capitais. Além disso, as próprias empresas brasileiras têm alimentado esse fluxo. Mas os técnicos do FMI, além de darem pouca atenção ao tsunami apontado pelas autoridades brasileiras, ainda recomendam abertamente políticas contrárias àquelas defendidas pela presidente e por seu ministro da Fazenda. As autoridades brasileiras deveriam refletir sobre esse conflito de opiniões e seu significado prático. O economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, elogiou vigorosamente a política monetária do Banco Central Europeu (BCE), ao apresentar, nessa terça-feira, a nova edição do Panorama Econômico Mundial. A melhora do cenário na zona do euro, depois do agravamento da crise em 2011, é explicável em boa parte, segundo ele, pela injeção de dinheiro "extremamente necessária" realizada pelo BCE. Além disso, os economistas do Fundo recomendam a sustentação de políticas monetárias brandas nos EUA, na Europa e no Japão, para dar maior segurança à recuperação econômica num cenário de riscos ainda consideráveis. Pelo menos num ponto esses economistas concordam com a avaliação das autoridades brasileiras. Eles apoiam um ajuste fiscal mais lento e mais favorável ao crescimento nos países que tenham alguma folga orçamentária. Em alguns países ricos, argumentam os técnicos do FMI, os governos poderão aproveitar melhor esse espaço se apresentarem aos mercados programas confiáveis de médio prazo e adotarem explicitamente regras de disciplina orçamentária. É inútil buscar esse caminho sem o apoio do mercado financeiro. Se faltar confiança na política oficial, os agentes financeiros tenderão a retrair-se e tudo ficará mais complicado. Mas o ajuste é absolutamente necessário, insiste Blanchard, e a única liberdade dos governos consiste na escolha do ritmo e das condições de realização da tarefa. Mas só terá essa liberdade quem transmitir segurança aos mercados. Esse é um jogo muito complicado, mas o governo brasileiro despreza esses detalhes, quando faz sua campanha por mais incentivos fiscais e menos estímulos monetários nos países avançados. O governo brasileiro daria uma demonstração de realismo se levasse em conta aquelas condições, bem como a enorme dificuldade de mudar a curto prazo as políticas monetárias nos países mais desenvolvidos. São políticas importantes para a reativação econômica dos EUA, Europa e Japão, que não se atreverão a abandoná-las enquanto os riscos de recaída na recessão permanecerem elevados. Brasília obteria resultados muito melhores se abrandasse a retórica sobre o câmbio e sobre a maldade dos países ricos e cuidasse mais seriamente dos outros fatores - todos bem conhecidos - de competitividade. Mas há outro fator de divergência entre os economistas do Fundo e de Brasília. O risco de superaquecimento da economia brasileira diminuiu, mas não parece ter sido eliminado. A forte expansão do crédito e a demanda de importações justificam essa dúvida. Além disso, os estímulos ao mercado interno têm produzido efeitos e o crescimento deve acelerar em 2012 e 2013, aproximando-se do limite de segurança, segundo comentou um dos chefes do Departamento de Pesquisa, Thomas Helbling. Resumo: é hora de ter mais cuidado com a redução dos juros, embora esse seja um compromisso da presidente Dilma Rousseff. Há um caminho de baixo risco, no entanto, para a redução dos juros: um controle mais rigoroso do gasto público. O governo sabe disso.