
07 de maio de 2013 | 07h13
Um desvio considerável, mas dentro da margem, é desculpável em certas situações. O caso brasileiro é diferente. Outros países - da Ásia e da América do Sul - também foram afetados pela alta das cotações de alimentos e de outras commodities, mas conseguiram desempenho muito melhor que o do Brasil, com inflação menor e crescimento muito maior.
Contra a evidência internacional, o ministro continua atribuindo a inflação brasileira a um choque de oferta. Despreza, assim, outros fatores bem conhecidos e muito mais importantes, como a rápida expansão do crédito, os estímulos ao consumo, a elevação da renda dos consumidores e, é óbvio, a gastança federal, jamais interrompida.
O ministro seguiu no mesmo rumo ao comentar as contas públicas. "Nós cumpriremos à risca as metas fiscais do governo, como sempre fizemos. Sou ministro da Fazenda há sete anos e sempre cumpri à risca as metas", afirmou. Pode ser um problema de memória, mas parece pouco provável. Afinal, ele tem sido coerente, ao longo dos anos, no esforço para disfarçar o abandono progressivo, mas inegável, dos mais respeitáveis critérios da política econômica.
Fiel a esse padrão, ele deixou de mencionar o uso de investimentos - até do discutível Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - para reduzir a meta fiscal definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Pior que isso: omitiu o recurso a uma contabilidade cada vez mais criativa - escandalosamente criativa - para fechar as contas no fim do ano.
O mesmo critério valeu para seu comentário sobre a dívida pública. Nenhuma pessoa informada deixaria de notar dois pontos. Primeiro, a dívida líquida pode ter melhorado, de fato, mas uma dose de maquiagem é inegável: alguns grandes ativos correspondem a repasses do Tesouro a bancos federais. Quanto valem realmente esses ativos? Segundo, o ministro da Fazenda, como seus colegas do governo, insiste em comentar só a dívida líquida. Mas a dívida bruta tem crescido. Nesse quesito, a situação de vários países emergentes é bem mais confortável.
Mas o ministro da Fazenda conseguiu superar-se ao falar do comércio exterior. Segundo ele, as importações têm crescido bem mais que as exportações porque o Brasil cresce mais que outras economias. É mesmo? E isso justifica um déficit de US$ 5,74 bilhões em quatro meses e uma semana?
Ele foi além. No ano passado, quando o Brasil cresceu menos (talvez ele tenha ficado com vergonha de mencionar o crescimento de 0,9%), "caiu mais a importação do que a exportação". Alguém deve ter mentido ao ministro. Segundo os dados oficiais, o valor exportado caiu 5,26% no ano passado, enquanto o importado diminuiu 1,37%. Depois, o maior dinamismo da importação vem sendo observado como tendência desde 2007.
O fim da entrevista foi uma obra-prima. "Nós conseguimos isolar a economia da política, de modo que não tem mais o ciclo político." Não há mais - este o sentido dessas palavras - influência de interesses eleitorais nas decisões econômicas. Mentiram de novo para ele - e ele acreditou. Não se pode mais confiar em colegas de governo?
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