
03 de maio de 2016 | 03h00
É triste constatar que Dilma Rousseff renunciou à possibilidade de deixar o governo com um mínimo de dignidade, se não admitindo honestamente erros cometidos – atitude que não combina com sua enorme arrogância – pelo menos se poupando, e ao País, do deplorável espetáculo desse ímpeto revanchista com que tenta transferir a outros a responsabilidade por sua clamorosa incompetência. A escalada de absurdos a que Dilma se entregou nesses últimos dias torna plausível até as mais disparatadas especulações que circulam em Brasília. Fala-se, por exemplo, que, para registrar de modo dramático sua indignação e repulsa ao “golpe” de que se considera vítima, Dilma estaria cogitando receber a comunicação oficial do afastamento literalmente acorrentada a sua cadeira presidencial. Só pensar em tal cena já é um disparate.
Se o desempenho de Dilma no comício da CUT já foi chocante, imagine-se o que virá por aí. O Palácio do Planalto programou, até o fim desta semana, uma intensa agenda de compromissos públicos que Dilma pretende usar não apenas para atacar os “golpistas” que a vitimam, como para continuar iludindo a população com o anúncio de projetos de “bondades” que certamente não ofereceria se ela própria tivesse que arcar, mesmo na qualidade de presidente da República, com o pagamento das contas. O rombo orçamentário previsto para este ano é de cerca de R$ 100 bilhões e até dias atrás Dilma não via problema em aprofundar esse buraco. O “pacote de bondades” anunciado pela presidente provocará, sem dúvida, um aumento do déficit orçamentário com o qual o próximo governo terá que se haver. É a chamada cortesia com o chapéu alheio, que depois permitirá ao PT, na oposição, criticar severamente o “descontrole das contas públicas”.
No campo estritamente político, alguns petistas se mostram dispostos a apoiar a ideia da realização de eleições presidenciais antecipadas que está sendo apresentada por um grupo de senadores. Há notícias de que Dilma estaria considerando essa possibilidade, que implicaria sua renúncia e a de Michel Temer a seus mandatos. Mas dentro do próprio PT há forte resistência à ideia, sob o argumento de que a renúncia de Dilma seria interpretada como uma confissão de culpa. E ninguém acredita que Michel Temer a aprove.
A antecipação do pleito presidencial para outubro próximo, coincidindo com as eleições municipais, objetivaria a escolha apenas de novos presidente e vice, para completar o mandato de Dilma, que termina em 31 de dezembro de 2018. A novidade dependeria da aprovação de uma emenda constitucional. Mesmo que Senado e Câmara conseguissem cumprir os prazos estabelecidos para a tramitação da emenda e o Tribunal Superior Eleitoral lograsse preparar em tempo a eleição para outubro, o quórum exigido para aprovação é praticamente inatingível nas atuais circunstâncias políticas. Além disso, a proposta esbarraria na intransponível cláusula constitucional da anualidade exigida para todas as modificações do processo eleitoral. A proposta, portanto, se presta apenas a tumultuar o ambiente político e retardar o urgente trabalho de reconstrução que o País exige.
Mas não é um disparate, como alguns julgam. Afinal, seria desta maneira que o PT reduziria os prejuízos eleitorais que o petrolão e o desastre do governo Dilma decerto lhe causarão. E, mais importante, a campanha eleitoral colocaria Lula, hoje um dois de paus, novamente no proscênio político. Dilma e a tigrada do PT, enquanto agonizam politicamente, não deixarão passar nenhuma oportunidade para “infernizar” o governo que deverá assumir nos próximos dias. O País? Ora, o País que se dane.
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