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O perfil da magistratura

O censo é fundamental para entender quem são e como pensam os juízes e quais são os valores e as visões de mundo daqueles que decidem os litígios levados à Justiça

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Por Redação
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Pela segunda vez, desde sua criação em 2005, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) promoveu um levantamento do perfil sociodemográfico da magistratura, reunindo dados sobre cor, gênero, naturalidade, origem social, estado civil, número de filhos, formação acadêmica e trajetória profissional de seus integrantes. Realizada entre abril e maio deste ano, a pesquisa teve a participação de 62,5% dos 18.168 juízes, desembargadores e ministros de todos os braços especializados do Poder Judiciário e foi coordenada pela socióloga Maria Tereza Sadek, diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ e professora da USP.

O primeiro censo sociodemográfico oficial da Justiça brasileira foi realizado pelo CNJ em 2013 e envolveu 64% dos 16.812 magistrados em atividade na época. Há duas décadas e meia, um estudo semelhante foi encomendado pela Associação dos Magistrados Brasileiros a um grupo de sociólogos liderado por Luís Werneck Vianna e resultou, com base nas respostas de 3.927 juízes, num livro hoje considerado clássico nas ciências humanas, intitulado Corpo e Alma da Magistratura Brasileira. O próximo censo sociodemográfico do CNJ já está marcado para 2020 e faz parte de um conjunto de estudos estatísticos sobre a composição e o funcionamento do Judiciário, cujos tribunais até recentemente eram refratários a esse tipo de trabalho.

Segundo o levantamento, 80,3% dos magistrados declararam-se brancos, 18% identificaram-se como negros e pardos, 1,6% respondeu ser de origem asiática e 0,1% apresentou-se como indígena. A idade média do magistrado brasileiro é de 47 anos. A Justiça Federal é a que tem magistrados mais jovens: 13% deles têm até 34 anos. O censo sociodemográfico do CNJ também revela que 80% dos magistrados são casados ou possuem união estável, 10% são solteiros, 9% são divorciados e 1%, viúvo. Mostra, ainda, que 57,5% são católicos e 18% declararam não ter religião - entre os 24,5% restantes estão os seguidores de outras religiões e credos.

Por gênero, 63% da magistratura é integrada por homens e 37%, por mulheres. Na década de 1990, a relação era de 75% e 25%, respectivamente, o que mostra um aumento das mulheres no Poder Judiciário. Esse aumento, contudo, é mal distribuído na hierarquia judicial. As mulheres representam 44% no primeiro estágio da carreira, a de juiz substituto, e 39% no estágio seguinte, de juízes titulares. Mas o número vai diminuindo nas instâncias mais altas. Nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais e Trabalhistas, as mulheres representam 23% do total de desembargadores. E, nos tribunais superiores, apenas 16%. “É possível que haja uma dose de preconceito, já que para entrar mulheres e homens competem por meio de provas. Além disso, algumas progressões dependem de indicações. E as mulheres ainda têm muitas atribuições domésticas e isso tem impacto profissional. São dados que precisam ser estudados, pois não fomos a fundo em relação aos motivos dessa diferença, que também pode ser observada em outras carreiras jurídicas”, afirma Sadek.

Outra informação importante por ela apontada, e que resulta das medidas adotadas pelo CNJ ao longo dos últimos anos para coibir o nepotismo nos tribunais, diz respeito à diminuição da entrada de parentes na magistratura. Segundo a pesquisa, 13% dos que ingressaram na corporação após 2011 possuíam familiares juízes ou desembargadores. Em 1990, eram 30%. Ainda assim, a pesquisa mostra que, quanto maior é a posição na hierarquia da carreira, maior é a proporção de parentes: 14% entre os juízes substitutos, 20% entre os juízes titulares e 30% entre os desembargadores. O censo revela ainda que 43% dos magistrados concluíram algum curso de capacitação nos 12 meses anteriores ao período de realização da pesquisa.

O censo da magistratura é fundamental para entender quem são e como pensam os juízes e quais são os valores e as visões de mundo daqueles que decidem os litígios levados à Justiça e as demandas de quem recorre a ela para lutar por seus direitos.