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O reajuste dos pedágios

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Por Redação
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Ao suspender o reajuste anual dos pedágios das rodovias federais para aplacar as pressões dos movimentos populares, dois dias depois de o governador Geraldo Alckmin ter tomado a mesma decisão com relação às rodovias do Estado de São Paulo, a presidente Dilma Rousseff apenas adiou a solução de um problema. Mais dia, menos dia, os pedágios terão de ser reajustados. E, quando isso ocorrer, o porcentual será muito maior do que o que deveria ser aplicado agora, podendo com isso gerar o pretexto para uma nova onda de protestos. Outro problema tão grave quanto esse é a insegurança jurídica disseminada por essa decisão de caráter eminentemente político. As rodovias federais e paulistas sob responsabilidade de concessionárias particulares foram privatizadas por meio de licitações realizadas com base em regras claras e formalizadas por contratos firmados rigorosamente de acordo com a legislação em vigor. Por isso, do ponto de vista legal, a suspensão do reajuste das tarifas pode configurar quebra de contrato, gerando uma série de dificuldades econômicas e jurídicas para as concessionárias. Elas têm custos fixos, como o pagamento de contas de água e energia e despesas contratadas com fornecedores. E ainda têm de cumprir a legislação trabalhista, depositando rigorosamente em dia os salários de seus funcionários. E, por lei, as concessionárias são obrigadas a honrar suas obrigações, independentemente das dificuldades financeiras que enfrentarem por causa de eventuais problemas ocorridos com suas fontes de receita. Desde que Alckmin e Dilma alegaram que "não há clima" para o reajuste dos pedágios, e também do serviço de balsas e até da Ponte Rio-Niterói, o Ministério dos Transportes e a Secretaria de Transportes de São Paulo passaram a estudar medidas para contornar os problemas jurídicos da suspensão dos reajustes dos pedágios. Uma das estratégias adotadas foi pedir à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que acelerasse os trabalhos de revisão tarifária que já estavam em curso. Outra estratégia para adiar o reajuste foi submeter as concessionárias a um exame meticuloso dos custos dos serviços por elas prestados, como forma de pressão para se chegar a uma "tarifa mais justa" para os usuários. "O reajuste está previsto em contrato, é anual e corresponde à Variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo. Mas, enquanto a inflação puxa o reajuste para cima, podemos fazer descontos que puxem o índice para baixo. A tarifa pode sofrer descontos por investimentos não realizados. Já houve casos de reajuste zero", diz a superintendente de Infraestrutura Rodoviária da Agência Nacional de Transportes Terrestres, Viviane Esse. Para aplacar o descontentamento das concessionárias e evitar que recorram aos tribunais, exigindo que as diferentes instâncias do poder público cumpram o que firmaram nos contratos de privatização das rodovias, os assessores de Alckmin e Dilma estariam negociando com as empresas compensações para garantir seu equilíbrio econômico e financeiro. A iniciativa pode surtir algum efeito no curto prazo, mas não passa de uma gambiarra jurídica que pode, mais à frente, resultar em arrastadas e vultosas pendências judiciais. Isso já aconteceu no passado, quando a instabilidade crônica das regulações públicas, a falta de transparência nas decisões administrativas e o desrespeito aos contratos negaram à iniciativa privada a segurança jurídica de que ela necessitava para investir em áreas estratégicas. Em outras palavras, quando as regras do jogo são instáveis, mudando ao sabor da conjuntura política, as empresas tendem a adiar planos de expansão e postergar investimentos, o que acaba inibindo o crescimento econômico do país e a geração de empregos. E quem perde com isso, é a sociedade como um todo. A suspensão dos reajustes dos pedágios configura assim um precedente perigoso, que pode levar a uma quebra de confiança de investidores, trabalhadores e consumidores no funcionamento das instituições de direito.