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O risco de mais um apagão

Atualmente, há no País 600 mil engenheiros, o equivalente a 6 profissionais para cada mil trabalhadores. Nos Estados Unidos e no Japão, a proporção é de 25 engenheiros por mil trabalhadores

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Por Redação
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Apesar de as autoridades educacionais e as agências de fomento à pesquisa virem investindo há anos em programas destinados a acelerar a formação de capital humano, com ênfase ao aumento do número de formandos na área de ciências exatas, condição indispensável para a passagem da economia brasileira a níveis mais sofisticados de produção, os resultados ainda estão longe dos esperados.

Na área de engenharia, por exemplo, o Brasil tem formado em média cerca de 40 mil a 45 mil engenheiros por ano, segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). É um número pequeno em comparação com o de outros países emergentes. Rússia, Índia e China vêm formando anualmente, em média, 190 mil, 220 mil e 650 mil engenheiros, respectivamente. Atualmente, há no País 600 mil engenheiros, o equivalente a 6 profissionais para cada mil trabalhadores. Nos Estados Unidos e no Japão, a proporção é de 25 engenheiros por mil trabalhadores.

Além disso, do total dos 40 mil engenheiros que se formam anualmente no Brasil, um número expressivo não está empregado em atividades típicas da profissão. E, entre os que estão, há um número expressivo trabalhando em engenharia civil, a área que menos emprega tecnologia. Por isso, setores como os de petróleo, gás, microeletrônica, nanotecnologia e tecnologia de comunicações sofrem com a escassez desses profissionais. No setor financeiro, a falta de profissionais qualificados levou bancos e seguradoras a contratar profissionais recém-formados em matemática e ciências atuariais para trabalhar em atividades que são exercidas por especialistas em engenharia financeira, como análise de risco, modelagem, precificação e uso de plataformas de investimentos com base em algoritmos.

Dentre os engenheiros que trabalham nas áreas mais complexas, muitos têm o domínio das tecnologias em vigor, mas não o preparo necessário para acompanhar o processo de desenvolvimento de tecnologias de ponta. Eles sabem montar celulares, por exemplo, mas não estão desenvolvendo chips eletrônicos. Apesar de existirem escolas de engenharia com excelentes programas de pós-graduação, há uma distância enorme entre a produção científica e sua absorção em inovações na produção, lembra o diretor do Banco Mundial, Otaviano Canuto.

Para atenuar o problema, a partir da década de 2000 o Ministério da Educação, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico lançaram importantes programas com o objetivo de formar um número suficiente de engenheiros para dar conta da demanda que deverá surgir nas áreas de ponta com a retomada do crescimento econômico. Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada advertem para o risco de apagão de mão de obra qualificada na área de engenharia, caso o PIB venha a crescer a taxas mais altas, por causa de mudanças tecnológicas em determinados setores.

Entre os programas lançados nos últimos anos, destacam-se os destinados a estimular as novas gerações a optar pela área de ciências exatas nos vestibulares e a reduzir a altíssima taxa de evasão nos cursos de engenharia, que em algumas faculdades chega a 55%. Na primeira metade da atual década, das 302 mil vagas oferecidas pelas escolas brasileiras de engenharia, apenas 120 mil estavam preenchidas. O problema da evasão é agravado pela falta de interesse dos jovens pela profissão, que decorre, em parte, da falta de preparo dos vestibulandos em matemática, física e química.

Do mesmo modo que chamam a atenção para a reforma do ensino médio, vital para aumentar o nível de proficiência dos vestibulandos em matemática, especialistas em inovação e produtividade enfatizam a necessidade de estimular os cursos de pós-graduação a aumentar o número de engenheiros preparados para lidar com tecnologias de ponta. Sem isso, o Brasil corre o risco de ficar fora das cadeias globais da produção, advertem.