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O rombo oculto do comércio

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Por Redação
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O buraco de US$ 3 bilhões no comércio exterior, o pior resultado no primeiro semestre em 18 anos, foi menos feio que o resultado real mascarado nas contas oficiais. De janeiro a junho, as exportações de manufaturados, no valor de US$ 42,77 bilhões segundo o governo, foram infladas com vendas fictícias, no valor de US$ 2,43 bilhões, de plataformas para extração de petróleo. Só em junho esse tipo de operação proporcionou uma receita meramente contábil de US$ 1,63 bilhão. Esse valor corresponde a dois terços do superávit comercial de US$ 2,39 bilhões registrado no mês pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. A melhora efetiva na conta comercial, depois de um semestre de resultados muito ruins, foi bem mais modesta do que poderia parecer à primeira vista e combina muito com o desempenho ainda fraco da indústria. Mesmo inflada pela exportação fictícia de plataformas, a receita das vendas externas, de US$ 114,52 bilhões de janeiro a junho, ainda foi 0,7% menor que a dos primeiros seis meses de 2012. Ao mesmo tempo, o gasto com importações, de US$ 117,52 bilhões, foi 8,4% maior que o de um ano antes. Houve alguma reação em junho, mas bem menos notável que a indicada pelos números oficiais. Descontado o valor da plataforma (US$ 1,63 bilhão), a receita do mês ficaria reduzida a US$ 19,6 bilhões e seria apenas 1,29% maior que a de um ano antes. A variação teria sido menor 1,5% que a das compras externas. As importações começaram a crescer mais que as exportações em 2007. Essa tendência foi interrompida na recessão, mas logo ressurgiu.A erosão do superávit comercial, mais acentuada a partir de 2011, resultou de vários fatores com pesos diferentes em diferentes momentos. A valorização do real encareceu as exportações e barateou as importações. Isso resultou em parte da grande oferta de dólares, mas a inflação acentuou o desajuste cambial. Custos importantes, como o da mão de obra, reduziram o poder de competição dos produtores nacionais. Mesmo sem o aumento real dos salários, no entanto, os exportadores já estariam em desvantagem, por causa da tributação e dos problemas de logística, para citar apenas dois fatores de grande relevância. Além disso, erros diplomáticos dificultaram o acesso dos produtores a mercados do mundo rico e tornaram o comércio brasileiro muito dependente do Mercosul, de alguns compradores da vizinhança e da China. Uma das consequências dos vários erros cometidos pelo governo - na diplomacia e na política interna - foi a dependência crescente das exportações de commodities, isto é, de produtos básicos e semimanufaturados. Neste ano, as vendas desses dois tipos de produtos, embora menores que as de um ano antes, ainda proporcionaram, em conjunto, 60,4% da receita de exportações. As exportações de manufaturados (37,3% do valor total) aumentaram 0,4%, mas graças, em grande parte, à receita contábil das operações com as plataformas. A piora da conta comercial é evidente, apesar da confusão introduzida nos números pelas estranhas práticas do governo. Parte das importações de combustíveis e de lubrificantes de 2012 só apareceu nos registros neste ano. Nesse caso, a distorção foi limitada, porque as compras ocorreram e acabariam entrando nas contas. A distorção mais grave é a das exportações fictícias permitidas pelo Repetro, regime especial criado nos anos 90 e reformulado várias vezes na década seguinte.Por esse regime, uma empresa do setor de equipamentos para petróleo pode realizar uma exportação meramente contábil para uma subsidiária da Petrobrás. Esse mesmo equipamento é em seguida usado no Brasil mediante aluguel. O sistema foi criado para reduzir a tributação paga pela Petrobrás e por outras companhias dedicadas à pesquisa e extração de petróleo e gás. No mercado financeiro, a projeção mais recente é de um superávit comercial de US$ 6 bilhões, menos de um terço do obtido em 2012, de US$ 19,41 bilhões. No começo do ano, projetava-se um saldo de US$ 15 bilhões.