Imagem ex-librisOpinião do Estadão

O Senado poupará 0,29%!

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

O relatório preliminar, elaborado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), sobre a reforma administrativa do Senado - atendendo a encomenda feita há 35 dias pelo presidente da Casa, senador José Sarney (PMDB-AM) - propõe a redução do atual número de 110 diretores para 7, extingue 187 das 630 funções comissionadas, retira do diretor-geral o comando de 20 secretarias, deixando-lhe o controle de apenas 6 departamentos, e sugere outras mudanças para o aparente "enxugamento" estrutural da Câmara Alta. Essas medidas propiciariam um corte de R$ 650 mil mensais, o que significa que a proposta de reforma encaminhada pela FGV ao Senado - em 124 páginas, ao custo de R$ 250 mil - não representará para os cofres públicos economia maior do que 0,29% de um orçamento anual de R$ 2,7 bilhões. É bem verdade, como disseram os consultores da FGV que entregaram o estudo, que o foco não foi reduzir despesas e que o Senado "não pode se sujeitar a cortes pirotécnicos e comprometer o trabalho de seu corpo administrativo". Há que se levar em conta a necessidade de a estrutura e o funcionalismo da Casa darem a melhor cobertura, o maior apoio possível ao trabalho parlamentar. Porém, a racionalização administrativa, ao dificultar a interferência político-clientelística dos próprios parlamentares na burocracia do Senado, certamente haveria de melhorar o suporte às atividades dos seus integrantes e, com isso, dar o melhor aproveitamento aos recursos públicos alocados ao Poder Legislativo. Não se pode negar, especialmente pela grande quantidade de informações que tem vindo à tona - umas ignoradas, outras sabidas e não lembradas e algumas surpreendentemente descobertas -, que nas duas Casas Legislativas federais, assim como nos Legislativos dos Estados e municípios brasileiros, tem prevalecido o vício velho e crônico do patrimonialismo, que leva à abusiva confusão entre o que é público e o que é interesse privado. Escândalos como o das passagens aéreas, o das verbas indenizatórias, o do pagamento de horas extras em tempo de recesso parlamentar, o dos inúmeros casos envolvendo o diretor-geral do Senado - depois de a Casa ter passado por uma das mais constrangedoras crises éticas, como a que envolvera seu então presidente - deixaram desconfianças profundas na opinião pública. Expressou-se com propriedade o presidente José Sarney quando disse: "Alguns problemas são vergonhosos e empanaram os propósitos que nos levaram a uma reforma que amplamente atendesse aos objetivos de modernização da administração pública no Senado." Dentro desse quadro, passam a ser completamente secundárias, se não irrelevantes, as considerações a respeito de não se haver reduzido, ou mesmo de se aumentar, os salários dos diretores da Câmara Alta. Muito mais importantes serão as medidas que assegurem a introdução de um fator fundamental de moralização em qualquer tipo ou instância de administração pública: vale dizer, a transparência. Infelizmente o relatório da FGV não indica a maneira pela qual a sociedade possa acompanhar, com maior objetividade e presteza, o processo de racionalização da estrutura organizacional do Senado. Existe a promessa - ainda não cumprida - de dar ao público a possibilidade de acompanhar, via internet, tanto a utilização das verbas indenizatórias quanto a das passagens aéreas custeadas pelo erário. Isso talvez seja muito pouco, levando-se em conta a necessidade de se obter a melhor recuperação possível da imagem do Senado - e, de resto, de todo o Poder Legislativo brasileiro. É bom lembrar, por último, que o presidente José Sarney já encomendara estudo semelhante à própria FGV, para a racionalização administrativa do mesmo Senado - quando o presidia, em 1995. O plano encomendado jamais saiu do papel. Resta esperar que o ex-presidente da República e senador maranhense do Amapá desta vez atente mais para sua própria biografia do que para interesses políticos imediatos e use sua influência para não deixar a reforma da Casa que preside voltar a dormir no berço esplêndido das inovações irrealizáveis e das mudanças sepultáveis, por falta de interesse político ou por interesses fisiologicamente contrários.