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O tamanho da encrenca

A próxima administração federal terá de cortar despesas de maneira profunda e persistente como poucas vezes se viu

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Por Redação
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A confiança com que os investidores, como a maior parte dos brasileiros, aguardam a posse do novo governo contribui para a construção de um ambiente positivo que tende a impulsionar a atividade econômica, ainda em lenta recuperação, e, assim, a assegurar maiores receitas para o setor público. A preservação desse clima ao longo do próximo ano está condicionada à firmeza e à competência com que a equipe do futuro presidente Jair Bolsonaro enfrentar os graves problemas fiscais que já tolhem ações do governo atual e, se mantidos, podem comprometer as do próximo. Mesmo, porém, que a economia cresça e medidas essenciais, como a reforma da Previdência, sejam decididas ou encaminhadas de maneira adequada, a próxima administração federal terá de cortar despesas de maneira profunda e persistente como poucas vezes se viu. Só assim conseguirá respeitar os limites estabelecidos por lei. Para cumprir o teto de gastos, que não podem crescer em ritmo maior do que o da inflação, serão necessários cortes de R$ 37,2 bilhões por ano, durante os quatro anos do mandato do presidente eleito, como mostrou o Estado.

Em quatro anos, por isso, será necessário cortar R$ 148,8 bilhões das despesas primárias, das quais estão excluídos os pagamentos de juros da dívida pública. É esse o tamanho da encrenca imediata na área fiscal. Mas mesmo com os cortes não estarão asseguradas as condições para que, ao final do mandato do próximo presidente, as contas públicas comecem a registrar saldo primário positivo. Só em 2023, já no governo seguinte, as contas do governo federal poderão registrar superávit primário, indispensável para que se comece a reduzir o tamanho da dívida pública, cujos montante e evolução são fonte de desconfianças no mercado financeiro. Essa é a projeção da Instituição Fiscal Independente, órgão técnico do Senado. Se as coisas não forem feitas como devem ser, a situação ficará muito pior.

Como informou o Estado, esses números já estão sendo discutidos pela equipe econômica do governo Temer com representantes do futuro governo Bolsonaro. Uma das medidas em exame pela equipe do próximo presidente é a redução das gastos com subsídios, que terá impacto imediato nas contas do governo; outra é a aprovação da reforma previdenciária no próximo ano, com efeitos sobre as contas públicas nos três anos seguintes.

Estuda-se também a contenção dos reajustes dos vencimentos dos servidores. Hoje, os aumentos são feitos de maneira automática, com base na inflação e no crescimento do PIB de dois anos antes. Uma das ideias é a correção apenas pela inflação do ano anterior.

Um dos problemas mais complexos da gestão orçamentária, a vinculação de receitas - isto é, a obrigatoriedade de aplicação de determinadas receitas em áreas predeterminadas -, também está no foco das atenções da equipe do próximo governo. A vinculação, bem como o comprometido da maior parte das receitas na cobertura de despesas consideradas obrigatórias, como folha de pessoal e benefícios previdenciários, reduz drasticamente a parcela dos recursos orçamentários cujo destino o governo pode decidir de acordo com seu programa de ação.

Medidas desse tipo, e outras que podem ser implementadas, tornarão menos complicado o cumprimento das metas fiscais para este ano (déficit primário de R$ 159 bilhões) e de 2019 (déficit de R$ 139 bilhões). Para este ano, já se prevê que o déficit primário ficará R$ 20 bilhões abaixo do limite. Mas o resultado poderá ser ainda melhor, pois os Ministérios não estão conseguindo realizar os gastos já liberados. Também não há, até o momento, sinais de que a meta de 2019 não possa ser cumprida.

Mesmo que tudo isso se confirme, continuará o problema do cumprimento do teto de gastos. Parte expressiva das despesas continua a crescer a um ritmo superior ao da inflação, o que pode ser compensado pelo aumento correspondente das receitas, caso a economia cresça a uma velocidade apreciável. Isso facilita o cumprimento da meta fiscal. Mas o teto pode estar ameaçado.