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O varejo do terror

Foi o terceiro atentado desta natureza em solo britânico em pouco mais de dois meses, somando-se aos ataques realizados contra o Parlamento, no dia 22 de março, e contra os milhares de jovens que assistiam a um show em Manchester, no dia 22 do mês passado

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Por Redação
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Na noite do último sábado, por volta das 22 horas no horário local – 18 horas em Brasília –, um homem lançou a caminhonete que dirigia sobre os pedestres que atravessavam a Ponte de Londres, um dos principais pontos da capital do Reino Unido. Dezenas de pessoas foram atingidas. Após cruzar a ponte, deixando para trás uma onda de choque e desespero, o motorista colidiu o veículo contra um muro da Catedral de Southwark e parou. Do carro saíram três terroristas, que passaram a esfaquear a esmo os frequentadores dos bares e restaurantes de Borough Market, outra conhecida região turística de Londres. Sete pessoas morreram e 48 ficaram feridas, 21 delas em estado grave.

Apenas oito minutos depois de ter sido acionada, a polícia londrina matou os três terroristas, dois deles com as identidades já reveladas: Khuram Shazad Butt, 27 anos, cidadão britânico de origem paquistanesa; e Rachid Redouane, 30 anos, cidadão marroquino. Na noite de domingo, o grupo terrorista Estado Islâmico reivindicou a autoria dos ataques.

A eficiência da polícia não foi suficiente para conter a ação criminosa. Não por incompetência ou escassez de meios, ao contrário, mas pela nova – e assustadora – faceta varejista do terror. Foi o terceiro atentado desta natureza em solo britânico em pouco mais de dois meses, somando-se aos ataques realizados contra o Parlamento, no dia 22 de março, e contra os milhares de jovens que assistiam a um show em Manchester, no dia 22 do mês passado. Em comum, além da ignomínia própria dos ataques desse tipo, a ação isolada dos terroristas.

A furtividade é da essência do terrorismo. O pânico causado por uma ameaça potencial é o ativo com que contam os facínoras para negociar pleitos nefastos ou impor crenças abjetas. Entretanto, o desafio que os ataques recentes têm imposto às forças de segurança e de inteligência dos países afetados é a participação direta de seus próprios cidadãos, o que dificulta a adoção de meios de contenção eficazes.

Por mais que se empreguem recursos humanos e materiais no mapeamento das atividades terroristas, nada será capaz de deter a ação dos chamados “lobos solitários”, que pelas mais diversas razões encontram na cantilena repetida diuturnamente por aquelas organizações o conforto para suas misérias pessoais. As cúpulas dirigentes desses bandos perceberam a vulnerabilidade de uma massa de degredados em suas próprias terras e passaram a cooptá-los por meio da internet, principalmente. Além da facilidade de acesso a este contingente de militantes, as organizações também perceberam que as ações furtivas e isoladas têm um potencial de terror ainda maior do que os ataques em grande escala, justamente por aproximá-las da violência urbana do dia a dia que tanto assusta os cidadãos das grandes metrópoles mundiais. Impingir o medo e a ameaça constantes é a estratégia de grupos como o Estado Islâmico.

A primeira-ministra britânica, Theresa May, endureceu o discurso e prometeu intensificar a luta contra o terrorismo. Entre as medidas que pretende propor, a premiê destacou a adoção de leis mais duras contra os terroristas e o aumento da pressão sobre as empresas de tecnologia a fim de que reprimam o que chamou de “espaços online seguros para os jihadistas”. De fato, é na internet que a vasta maioria dos militantes é seduzida e recrutada pelas organizações terroristas.

Evidentemente, ações que visam à interceptação de comunicação entre as pessoas requerem muita cautela pelos valores que estão em jogo, como o direito à liberdade de expressão, ao anonimato e ao sigilo de correspondência. Entretanto, havendo indícios plausíveis de atividades suspeitas conduzidas por meio das redes sociais, o acesso aos dados dos usuários pelos órgãos de inteligência, com a devida autorização judicial, deve ser garantido pelas empresas, sob o risco de deixar a população à mercê de ataques tenebrosos como os havidos no fim de semana. Afinal, a única solução possível para evitar ou mitigar as ações terroristas é, justamente, a dissuasão do recrutamento.