
13 de setembro de 2013 | 02h09
Confinado a um quarto de 4 metros quadrados, sem banheiro nem luz solar, Molina podia receber apenas a visita, separadamente, de seu advogado e um ou outro parente. Enquanto isso, do lado de fora, grupos de paus-mandados de Evo atormentavam-no com ameaças de "invadir a embaixada". Franco-atiradores ficavam postados diante do prédio e um sicário teria sido contratado para executá-lo. Nos bastidores, diplomatas dos dois países fingiam negociar a transferência do asilado. O faz de conta viria a ser revelado pelo encarregado de negócios brasileiro, Eduardo Saboia, responsável pela representação na ausência de seu titular. Ele entrou para a história da Casa de Rio Branco graças ao seu corajoso ato humanitário de transportar Molina por terra para o território nacional. A viagem, em dois carros com placas diplomáticas, sob a proteção de um par de fuzileiros navais que serviam na Embaixada, durou 22 horas, sem incidentes.
O governo brasileiro, que ignorou os sucessivos pedidos de socorro de Saboia - a quem o senador sob a sua custódia vinha falando em se suicidar -, reagiu furiosamente ao ser informado de que ele chegara são e salvo a Brasília.
No Aeroporto de Guarulhos, de onde deveria viajar à Finlândia, o então chanceler Antonio Patriota recebeu um telefonema extremamente agressivo da presidente. Testemunhas ouviram-na exigir, aos berros, que Saboia fosse punido sumariamente. Agastado, Patriota replicou, também elevando a voz, que, na condição de responsável último pelas ações do colega, o punido devia ser ele próprio. O que de fato aconteceu, com a sua substituição no Ministério pelo embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, que chefiava a delegação brasileira na ONU.
A ira de Dilma contra Saboia não se explica apenas por ela se sentir vítima de um crime de lesa-majestade. Tão ou mais grave, aos seus olhos, há de ter sido a desmoralização de Evo, a quem o Planalto, desde Lula, presta incompreensível vassalagem. E decerto foi para acobertar a conduta submissa do governo que o Itamaraty ameaçou Molina, por intermédio de seu advogado, Fernando Tibúrcio, de expulsá-lo "no outro dia" de seu previsto depoimento no Senado - o que é muito diferente, por exemplo, de uma entrevista à imprensa. Tibúrcio revelou a chantagem à Justiça Federal, numa audiência relacionada com a ação movida por Saboia a fim de reunir evidências para a sindicância de que é alvo no Itamaraty. A Procuradoria da República no Distrito Federal irá apurar a presumível improbidade administrativa do secretário-geral da Casa.
Conforme o Itamaraty, ele só teria pedido para lembrar o senador dos termos da Convenção de Caracas. Ela não obriga os países signatários a conceder asilo. Mas - e isso não terá sido mencionado pelo diplomata - uma vez concedido o benefício, o asilado deve receber imediatamente o salvo-conduto de seu governo.
O que agrava o despudor do Planalto é o contraste entre o tratamento de presidiário dado a Molina e o de autoridade política ao deposto presidente hondurenho José Manuel Zelaya, que se asilara na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Nos quatro meses em que ali ficou, em 2009, transformou-a em seu quartel-general. Recebia quem quisesse, falava a jornalistas e incitava os adeptos a derrubar a "ditadura" hondurenha - com a plena aquiescência de Brasília.
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