Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Obama acelera a história

Exclusivo para assinantes
Por Redação
3 min de leitura

O tempo das relações internacionais se acelerou. É como se a mesa em que está posta a agenda política global tivesse ficado pequena para acomodar simultaneamente as questões que competem entre si com urgência renovada pelas deliberações dos líderes mundiais. Os motivos disso são evidentes. O primeiro é a mudança radical de atitude dos Estados Unidos adotada pelo presidente Barack Obama e acentuada pela crise financeira made in USA. Ela tornou insustentáveis os padrões convencionais de exercício da hegemonia americana e intensificou os efeitos da nova configuração de poder no globo, resultante da ascensão das principais economias emergentes, a começar por China e Brasil. O outro motivo de aceleração do ritmo da política internacional também tem que ver com a crise. A retração econômica alertou os governos dos principais países para o imperativo de se abrirem a novas iniciativas multilaterais, em um ambiente propenso antes ao entendimento do que à reiteração de antigas divergências. Foi o que se viu na acomodação das posições discordantes dos Estados Unidos e da União Europeia, na reunião de cúpula do G-20 na semana passada em Londres. E foi com a mesma disposição que os dignitários americanos e europeus se deslocaram a seguir a Estrasburgo, na fronteira franco-alemã, para a comemoração do 60º aniversário da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), a aliança militar outrora ocidental criada nos tempos sombrios da guerra fria e cujos mais recentes integrantes são - sinal dos tempos - a Croácia e a Albânia. No giro inaugural de Obama pelo exterior, que ainda o levaria a Praga e, enfim, a Ancara e Istambul, sabia-se que Estrasburgo representaria o teste mais difícil para as suas aspirações à liderança. Sob o emblema da Aliança Atlântica, ele havia se proposto a mostrar ali a nova face dos Estados Unidos e a persuadir os parceiros europeus a reforçar a sua presença militar no Afeganistão - uma guerra malparada e crescentemente impopular nos países que nela se engajaram para erradicar as bases da Al-Qaeda de Bin Laden, apoiadas pelo Taleban, ainda sob o impacto dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos. Há pouco, ao anunciar a sua nova estratégia afegã, Obama anunciou o envio de mais 21 mil soldados e especialistas em segurança e pediu à Europa outros 10 mil. (Dos 62 mil soldados estrangeiros no Afeganistão, 38 mil são americanos.) De Estrasburgo, com uma incursão à cidade alemã vizinha de Baden-Baden, o presidente americano saiu com o proverbial copo meio cheio, meio vazio. Foi, novamente, um sucesso onde quer que tenha entrado em contato com o público. "Você percebe que alguma coisa mudou quando vê pessoas com bandeiras dos Estados Unidos nas ruas", comentou a chanceler alemã, Angela Merkel. Aos interlocutores oficiais desculpou-se pela "arrogância" com que Washington os vinha tratando. Mas isso não tornou os europeus mais receptivos aos seus apelos. Ele conseguiu para o Afeganistão o reforço de apenas 5 mil homens, dos quais 3 mil temporários (até as eleições presidenciais de agosto no Afeganistão), e nenhuma tropa de combate. Sempre poderá se consolar com a ideia de que a Grã-Bretanha e a Itália pelo menos já não falam em retirar o seu pessoal. Nesse meio tempo, como quem quer um lugar na foto do mundo em rápida rotação, a Coreia do Norte cumpriu a promessa - para a Coreia do Sul e o Japão, uma ameaça - de lançar um foguete capaz de transportar mísseis a 6,7 mil quilômetros de distância. Em outubro de 2006, o famélico país do ditador Kim Jong-il se tornou, assumidamente, o oitavo do mundo a ter a bomba atômica. Agora, na versão de Pyongyang, o objetivo era levar ao espaço um satélite de comunicações. Para Obama, tratou-se de uma "provocação". Mas, no Conselho de Segurança da ONU, a Rússia e a China impediram a adoção das novas sanções desejadas pelos EUA e o Japão contra o regime norte-coreano. Com horas de diferença, Obama anunciou perante 30 mil pessoas em Praga um plano para "um mundo sem armas nucleares" - a primeira grande iniciativa americana nesse sentido desde o governo Ronald Reagan, nos anos 1980. "Na Casa Branca de hoje", escreveu o colunista Roger Cohen, do New York Times, "é a inteligência que dita o caminho." E faz girar mais depressa a roda da História.