12 de agosto de 2010 | 00h00
A LDO abre duas grandes brechas para o governo e as estatais escaparem da fiscalização e facilita o uso de uma terceira via de fuga.
O governo havia tentado limitar a certos tipos de projetos a aplicação das tabelas oficiais de custos e índices de construção civil e de rodovias, deixando livres da exigência a Petrobrás e a Eletrobrás. O TCU resistiu, a manobra foi denunciada, mas a bancada governista ganhou a parada. Um dispositivo introduzido no projeto isenta do controle as operações não classificadas como obras civis e dá ampla liberdade à Petrobrás e à Eletrobrás na elaboração de seus contratos.
As duas empresas foram especificadas pelo autor da emenda, o deputado Gilmar Machado (PT-MG), num comentário sobre sua façanha. A manobra teve, portanto, o objetivo bem definido de reduzir o controle público sobre a administração de duas grandes estatais envolvidas em projetos bilionários.
O governo também poderá escapar dos rigores da Lei de Licitações, na execução de obras pelo regime de empreitada. Houve polêmica sobre o assunto durante a tramitação do projeto da LDO, mas a pretensão do Executivo prevaleceu também nesse caso. O regime de empreitada poderá ser adotado em obras para a Copa do Mundo e para os Jogos Olímpicos.
O Executivo tentou, com êxito parcial, subtrair do Congresso o direito de interromper a execução de obras quando há indícios de irregularidades graves. As irregularidades são apontadas pelo TCU, órgão de assessoria do Legislativo.
O governo sustentou sua pretensão num argumento usado muitas vezes pelo presidente Lula: a interrupção de projetos pode ter um grande custo econômico e social. O presidente já chegou a defender a fiscalização apenas no fim das obras - quando a intervenção de um órgão como o TCU é obviamente pouco eficaz. Até parlamentares da base aliada resistiram à investida do Executivo, para evitar uma desmoralização muito evidente do Legislativo. Mas a defesa da prerrogativa do Congresso foi apenas parcial.
Os parlamentares poderão dar a palavra final sobre a suspensão de obras, mas o Executivo e suas empresas poderão apresentar um relatório sobre os custos da interrupção e assim defender a continuação da obra. Essa concessão abre, naturalmente, um bom espaço para o governo impor sua vontade também nesse caso, bastando mobilizar sua base no Congresso. Se isso ocorrer, o Congresso terá apenas conseguido salvar a face, encenando um diálogo com o Executivo.
A discussão sobre a LDO foi só uma etapa do longo conflito entre o governo petista e o TCU. O presidente Lula queixou-se muitas vezes da ação do tribunal, como se os seus técnicos e ministros agissem de forma irresponsável - ou por motivação político-partidária - ao apontar irregularidades em licitações ou na execução de projetos.
Mas o presidente jamais cobrou de seus colaboradores maior cuidado com as normas da administração pública na elaboração e na execução de projetos. Se o fez, não foi com ênfase e com clareza suficientes para mostrar a seriedade de suas intenções. Em muitos casos, se não em todos, a desatenção às normas é uma demonstração de irresponsabilidade ou de incompetência gerencial.
Pode-se discutir a qualidade de certos dispositivos da Lei de Licitações ou dos critérios do TCU. Se ocorrer essa discussão e se houver propostas sérias para a mudança das normas, o caminho correto, no Estado de Direito, é o encaminhamento de um projeto de reforma legal. Mas o presidente Lula jamais apresentou propostas estruturadas para esse tipo de mudança. É mais fácil acusar o TCU de atrapalhar o progresso do País.
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