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Ordem unida para o euro

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Por Redação
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O presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, propôs um pacto fiscal e monetário para evitar uma deflação, reanimar a economia do bloco e reduzir o desemprego. Ele já havia prometido usar todos os seus instrumentos para defender a economia da zona do euro, hoje formada por 18 países, e o próximo passo seria um afrouxamento monetário maior. Mas na semana passada ele dirigiu um novo e enfático recado aos governos da área - principalmente aos da Alemanha, da França e da Itália. Segundo ele, qualquer nova ação será muito mais eficaz se houver maior participação dos governos, com políticas orçamentárias coordenadas e um avanço em reformas para tornar os mercados mais flexíveis e mais dinâmicos.Um afrouxamento maior da política monetária envolverá, segundo a avaliação mais comum dos especialistas, uma ação semelhante àquela desenvolvida nos últimos anos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). Essa política, batizada como afrouxamento quantitativo (quantitative easing, ou QE), consistiu na compra de papéis do Tesouro e de títulos hipotecários em poder do sistema financeiro. Em troca desses títulos o Fed emitiu montanhas de dólares. Desde o começo do ano essa estratégia está sendo abandonada, gradualmente. A mudança foi iniciada quando os dirigentes da instituição consideraram bastante firmes os sinais de recuperação econômica e a redução do desemprego.Uma das consequências da reativação dos negócios nos Estados Unidos foi o aumento das importações, com benefícios evidentes para o Brasil e muitos outros países. Mas, enquanto durou a política de afrouxamento monetário, o governo brasileiro reclamou da enxurrada de dólares no mercado internacional - um fator de valorização do real e de encarecimento das exportações brasileiras. Esse encarecimento prejudica as vendas ao exterior, mas é apenas um dos entraves ao comércio. Autoridades brasileiras, incluída a presidente Dilma Rousseff, chegaram a falar de uma guerra cambial movida pelo Fed. Quando a redução dos incentivos monetários foi anunciada e o dólar se valorizou, Brasília reclamou de novo e o Banco Central (BC) passou a intervir no mercado para evitar o efeito inflacionário da depreciação do real. Além disso, em todos os momentos - antes, durante o afrouxamento, e depois da última mudança - o governo brasileiro atribuiu o baixo crescimento do País às condições do mercado internacional. Essa desculpa foi mantida mesmo quando a economia americana, ainda em convalescença, começou a crescer obviamente mais que a brasileira.Se o BCE implantar uma política de afrouxamento parecida com a americana, haverá um grande aumento da oferta de euros no mercado global. Se o euro se desvalorizar, as exportações brasileiras para os mercados da união monetária poderão ser prejudicadas. O governo brasileiro terá mais um motivo para reclamar e para atribuir os males do País à perversidade das potências estrangeiras.De janeiro a agosto deste ano, a União Europeia absorveu 18,7% das exportações brasileiras, parcela quase tão grande quanto a da América Latina e do Caribe (19,8%) e muito maior que a do Mercosul (10,5%). O comércio seria mais fácil e mais dinâmico se o Mercosul já tivesse um acordo com a União Europeia, mas a negociação continua emperrada. A responsabilidade é dos governos argentino e brasileiro, mais interessados em acordos com mercados muito menos importantes.A recuperação europeia será muito mais fácil e rápida se os governos atenderem à conclamação de Mário Draghi. Mas, para isso, o governo alemão terá de se dispor a maiores gastos, principalmente de investimento. França, Itália e outros países precisarão encontrar um equilíbrio entre o ajuste das contas públicas e a expansão fiscal necessária, a curto prazo, para estimular suas economias. Terão de avançar, além disso, em reformas nos mercados de bens e de trabalho, para torná-los mais flexíveis, mais competitivos e mais dinâmicos. É uma pauta parecida com a proposta pelo Fundo Monetário Internacional. Mas quem imporá ordem unida a todos esses países?