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Os camelôs estão de volta

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Por Redação
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O desmonte da Operação Delegada, criada por Gilberto Kassab para combater o comércio ambulante, que está sendo feito pelo prefeito Fernando Haddad, é uma demonstração de que, apesar da tentativa de se apresentar como moderno e dinâmico, seu governo retoma sem nenhuma cerimônia uma das práticas mais condenáveis da velha política brasileira - a de abandonar boas iniciativas só porque foram adotadas pelos adversários. Pouco importa se a população sai perdendo, desde que se satisfaça a necessidade de afirmação do novo governante.Lançada no final de 2009, essa operação - pela qual policiais militares (PMs) combatem camelôs ilegais em horário de folga, recebendo por esse trabalho extra um adicional pago pela Prefeitura - conseguiu resultados impressionantes num terreno em que sucessivas administrações só haviam colecionado derrotas. O comércio ambulante havia tomado conta de importantes ruas da cidade, transformadas em verdadeiros "camelódromos". Pela facilidade de fugir da polícia, misturando-se com a multidão, esses locais ofereciam condições ideais para a prática de vários tipos de crime. Sem falar que esse comércio - além da concorrência desleal com o comércio regular, que paga impostos - há muito deixou de ser apenas uma forma de sobrevivência para pessoas desempregadas. A maior parte de seus produtos é contrabandeada ou falsificada, quando não roubada. A situação foi se agravando cada vez mais, à medida que malogravam as tentativas de criar shopping centers populares. A Operação Delegada começou na Rua 25 de Março e adjacências e logo se estendeu aos principais locais de concentração de camelôs. Diminuíram sensivelmente tanto o número destes como os índices de criminalidade nas regiões em que eles atuavam. A explicação para isso é que o camelô desrespeitava os fiscais e os guardas municipais por saber que, nesse caso, podia apenas ser acusado de cometer infração administrativa. Não fazia e não faz o mesmo com PMs, porque pode ser preso por desacato. O êxito da operação foi tal que a experiência se estendeu a outras 17 cidades do Estado.É isso que está indo por água abaixo na capital. Haddad quis, de início, dar uma outra orientação à operação, com ênfase não mais no comércio ilegal, mas numa vaga segurança comunitária. Em março, foi assinado um convênio entre a Prefeitura e o governo do Estado para que um terço do efetivo da operação, segundo o desejo de Haddad, fizesse patrulha noturna em bairros distantes do centro, o que não interessou à maioria dos PMs. A verdade, como se comprova agora, é que Haddad parece determinado a acabar com a operação ou torná-la insignificante. Nos primeiros seis meses do seu governo, o número de PMs que trabalham na operação caiu de 3.439 para 1.853. E, durante audiência na Câmara Municipal, a secretária de Planejamento, Leda Paulani, deixou as coisas bem claras. Sobre o abandono do patrulhamento noturno, disse que "segurança é uma questão do Estado, em que o município contribui na medida do possível". É verdade, e por isso Haddad não deveria ter sugerido tal medida.Mais importante é o que ela disse sobre os camelôs: "Esse governo não compactua com nenhum tipo de violência policial, seja para retirar invasores das ocupações, seja para perseguir os camelôs nas ruas". O que está de acordo com outra declaração sua, que sintetiza o que pensa sobre a questão: "A Operação Delegada não era uma meta de nossa campanha e não é prioridade do governo".Falar em "violência policial" contra os camelôs na Operação Delegada é contrariar os fatos. O que Haddad vai fazer então com os camelôs ilegais, já que não admite a tal "violência"? Deixá-los tomar conta novamente das ruas, só por não admitir que outro governante pode também acertar? Aliás, é isso mesmo que já está acontecendo, como mostrou reportagem do Estado (18/8). E, com os camelôs, vem junto, aí sim, a violência, mas dos bandidos que se infiltram entre eles.