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Os cursos da USP Leste

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Por Redação
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Formandos das primeiras turmas de graduação da USP Leste enfrentam problemas para trabalhar nas áreas de especialização em que se formaram. Alguns dos cursos oferecidos pela instituição ? interdisciplinares e destinados a profissões novas, surgidas com o avanço da tecnologia ? concedem diplomas que ainda não são reconhecidos por conselhos profissionais e por sociedades científicas. Além disso, não há vagas na iniciativa privada e no setor público para esses profissionais. Os casos mais graves são os dos cursos de Obstetrícia e Gerontologia. O primeiro forma especialistas capazes de "cuidar da saúde de gestantes, parturientes, puérperas, recém-nascidos e familiares". O segundo se destina a formar profissionais capazes de gerenciar políticas públicas e projetos de qualidade de vida na terceira idade. Como o Conselho Regional de Enfermagem e a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia não reconhecem os diplomas expedidos pela USP Leste, os formandos correm o risco de ser processados por exercício ilegal da profissão. Por isso, dos 200 alunos formados por esses cursos, vários decidiram adiar o ingresso no mercado de trabalho, ficando à espera de uma solução para o problema. Outros optaram por uma área distinta da formação superior recebida. Só alguns poucos bacharéis que ingressaram na Justiça com pedido de liminar conseguiram obter registro provisório e estão autorizados a trabalhar como obstetras e gerontólogos. Alguns professores da USP Leste alegam que os cursos da instituição foram criados a partir de especialidades oferecidas por mestrados e doutorados para enfermeiros, médicos e profissionais de saúde ? categorias estabelecidas, fiscalizadas e reconhecidas por conselhos profissionais. O problema é que, nos casos de Obstetrícia e Gerontologia, os conselhos ainda não foram instituídos. Outros professores alegam que, se as instituições de ensino superior tiverem de oferecer apenas cursos de graduação que os conselhos profissionais e as sociedades científicas reconhecem, elas não conseguirão fazer pesquisas de ponta, alargar as fronteiras do conhecimento e abrir caminho para novas profissões. Na definição das prioridades da Universidade, em outras palavras, o que deveria prevalecer são os conselhos estaduais e nacional de educação e não os conselhos profissionais. Os argumentos são convincentes, mas a origem do problema está no modo como a USP Leste foi concebida e implantada. Os responsáveis pelo projeto, entusiasmados com inovações pontuais produzidas nos currículos das universidades federais na primeira gestão do presidente Lula, deixaram-se levar por modismos pedagógicos e estratégias de marketing. Com isso, em vez de se concentrar nas áreas tradicionais do conhecimento, eles acabaram oferecendo apenas cursos técnicos, como sistemas de informação, gestão ambiental, políticas públicas, obstetrícia e gerontologia, sob a justificativa de que isso permitiria aos alunos oriundos da região, uma das mais pobres da Grande São Paulo, ingressar rapidamente no mercado de trabalho. A criação de um novo campus da USP numa área carente foi uma iniciativa importante, pois ajuda a democratizar o acesso ao ensino superior público. Mas o projeto da USP Leste acabou sendo tocado às pressas pelo então governador Geraldo Alckmin, para servir de bandeira política na eleição de 2006.Tanto açodamento não permitiu, por exemplo, que a USP revogasse um discutível dispositivo de seu regimento, que proíbe a duplicação, na capital, dos cursos de medicina, engenharia ou economia. Esses cursos, seguramente, dariam melhor preparo aos alunos da zona leste, dando-lhes com isso a condição de ingresso no mercado de trabalho que os cursos técnicos não conseguem assegurar. É por isso que, no início do ano, alguns docentes lançaram a tese de que a USP Leste deveria ser repensada. A proposta, como era de esperar, sofreu fortes críticas dos diretores dos cursos da instituição. As dificuldades que os formandos estão enfrentando para obter registro profissional mostram que há algo de errado.