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Os custos do combate à crise

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Por Redação
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Vencer a recessão é o desafio mais urgente para os governos do mundo rico, mas seus ministros de Finanças já se preocupam com a etapa seguinte. A ameaça no horizonte é um surto de inflação, num cenário de contas públicas em más condições e Tesouros endividados. Desde o ano passado, trilhões de dólares foram injetados na economia para evitar a quebra dos maiores bancos, salvar grandes empresas, limitar o desemprego e estimular a reativação dos negócios. Juros foram cortados drasticamente e os bancos centrais emitiram dinheiro sem restrição. Todas essas medidas, consideradas necessárias para o combate à crise, são medicamentos fortes, têm sido usadas em doses muito grandes e é preciso pensar, desde já, em como cuidar de seus efeitos colaterais. Este foi o tema central da reunião de ministros de Finanças do Grupo dos 8 (G-8), na sexta-feira e no sábado, em Lecce, na Itália. O grupo é formado pelas sete maiores economias capitalistas - Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá - e pela Rússia. "Estratégias de saída" são essenciais para "promover uma recuperação sustentável no longo prazo", segundo o comunicado final do encontro. Não houve acordo quanto ao momento de se iniciar a saída. Para alguns ministros, como os da Alemanha e do Canadá, já há sinais de reativação econômica e é tempo de se pensar numa reversão das políticas de estímulo. Para outros, como o secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, é cedo para se mudar de rumo e conter as políticas de expansão. Mas todos acentuaram a importância de uma saída planejada e, tanto quanto possível, coordenada, para se evitarem os piores efeitos colaterais das ações anticrise adotadas pelos governos. Todos concordaram, enfim, em pedir ao FMI estudos para a formulação de uma estratégia de retirada. A solicitação, nesta altura, é apenas formalidade. Na mesma semana, num fórum em Istambul, o diretor-gerente adjunto do FMI, Murilo Portugal, havia mostrado como as políticas anticrise afetaram as contas públicas no mundo rico. Na Eurozona, as somas anunciadas como ajuda ao setor bancário, como injeções de capital e garantias, atingiram, até meados de maio, o equivalente a 21% do PIB regional. No Reino Unido, o comprometimento chegou a 69%. Nos Estados Unidos, a 18%. Na Irlanda, ao dobro do PIB. Na Suécia, a 50%, por causa da vulnerabilidade dos bancos suecos às condições dos países bálticos. Além disso, a emissão de títulos soberanos, isto é, de governos nacionais, deve continuar crescendo este ano, segundo o economista. Os administradores da dívida pública, alertou Murilo Portugal, terão de ser especialmente cuidadosos para avaliar a capacidade dos mercados de absorver novos títulos sem alterações muito importantes nas taxas de juros. Pressões sobre os juros, poderia ter acrescentado, já ocorreram no mercado onde circulam os papéis emitidos pelo Tesouro americano. A "estratégia de saída" foi um tema ressaltado também na avaliação da economia americana divulgada ontem pelo FMI. Um dos próximos desafios importantes, segundo o relatório preparado pela missão, será neutralizar os efeitos das maciças intervenções fiscais e monetárias. Será preciso, ressaltaram os economistas, coordenar essa estratégia com outros governos, por causa do elevado nível de competição internacional no setor financeiro. Tentativas de enfrentar o problema isoladamente poderão afetar de forma indesejável os fluxos de recursos no mercado. Os efeitos colaterais das políticas fiscais e monetárias adotadas no mundo rico serão importantes para as economias em desenvolvimento. Todas serão afetadas, de alguma forma, se as pressões inflacionárias produzidas pelas maciças intervenções não forem neutralizadas. Mas o aumento da dívida pública nos Estados Unidos e noutras economias desenvolvidas também criará riscos para os emergentes e para os pobres. Se o ajuste das contas públicas for atrasado, a rolagem dos títulos governamentais ficará muito cara. Todos os financiamentos serão afetados e nenhum país ficará livre das consequências. Um novo surto de juros elevados poderá custar pontos preciosos de crescimento econômico aos países em desenvolvimento.