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Os estragos da inflação

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Por Redação
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A inflação impõe danos cada vez mais sensíveis à economia nacional, afetando o poder de consumo das famílias e pressionando os custos empresariais. Segundo o governo, a alta de preços está sob controle e tende a perder impulso com a melhora da oferta de alimentos. Apesar desse discurso, analistas privados dão como certo mais um aumento de juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), prevista para os dias 28 e 29. Mesmo na área oficial há quem reforce essa expectativa. O presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, prometeu na semana passada uma política firme contra as pressões inflacionárias, chegando muito perto de anunciar uma nova elevação da taxa básica. A maior dúvida, neste momento, é sobre o aperto necessário para conter os estragos e evitar uma deterioração mais ampla do quadro econômico. Do lado do consumo, principal motor da economia nos últimos dois anos, os efeitos da inflação já são bastante claros. Foram detectados, por exemplo, na pesquisa mensal de intenção de consumo das famílias paulistanas conduzida pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo. De março para abril o indicador caiu 0,4% e chegou a 129,1 pontos. Desde 2010 esse foi o pior resultado para o mês. No quadrimestre, a média ficou em 132,7 pontos, o nível mais baixo em três anos. Há receio tanto das famílias quanto do sistema financeiro. Diante da expectativa de preços em alta e de juros maiores, os financiadores têm reduzido os prazos e elevado o custo dos empréstimos. Na última pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), de amplitude nacional, o índice de expectativa dos consumidores ficou estável em abril, em 113,9 pontos, depois de uma sequência de seis quedas. O número foi o mais baixo desde março de 2010. A confiança do consumidor, segundo análise da FGV, reflete "a preocupação das famílias com a situação econômica geral, a inflação e a situação financeira doméstica, tendo o mercado de trabalho como um ponto de sustentação". A maior parte das negociações proporcionou, no ano passado, aumentos salariais acima da inflação acumulada. Mas a aceleração da alta de preços vem erodindo mais sensivelmente a renda familiar desde os últimos meses de 2012. O emprego de fato permanece elevado, embora a criação de empregos tenha arrefecido na indústria. O setor industrial evitou demissões nos últimos anos, apesar do baixo nível de atividade. Demitir sai caro e, além disso, a oferta de mão de obra com as qualificações necessárias é escassa. Muitos dirigentes de empresas preferiram evitar as dificuldades de encontrar pessoal para recompor os quadros, no caso de uma reativação da economia. Essa foi uma das causas da elevação dos custos no último ano. Desde o segundo semestre de 2011 as empresas não financeiras têm perdido rentabilidade. Custos em alta e atividade em marcha lenta - com recuo da produção industrial em 2012 - têm afetado severamente os balanços. O jornal Valor divulgou na segunda-feira os resultados de um levantamento das contas de 238 empresas. A receita conjunta no primeiro trimestre, R$ 234,2 bilhões, foi 11% maior que a de igual período do ano passado. Mas os custos ficaram 12,6% acima do valor encontrado no período de janeiro a março do ano passado.A relação entre custos e faturamento subiu de 70,7% nos primeiros três meses de 2011 para 70,9% um ano depois e 71,9% em 2013. O número de companhias com prejuízo no primeiro trimestre (68) foi 20% maior que o de um ano antes. Uma das novidades, neste ano, foi a redução da lucratividade das empresas de bens de consumo, protegidas até há pouco pela disposição de compra das famílias.Uma política de crescimento baseada no estímulo ao consumido dificilmente seria sustentável por muitos anos, no Brasil. Com a inflação acelerada afetando tanto os consumidores quanto as indústrias, essa impossibilidade fica ainda mais clara. Se um novo erro político facilitar o repasse dos custos aos preços finais, o resultado será um desastre. Ainda há tempo para evitar esse erro.