
04 de dezembro de 2010 | 00h00
Estabeleceu-se no Brasil um "capitalismo de laços", como essa nova forma de participação cruzada do Estado e de grupos privados no capital das grandes empresas brasileiras é designada pelo economista e professor do Insper Sérgio Lazzarini. Durante seis anos, Lazzarini pesquisou a composição acionária de 804 companhias, todas as de capital aberto e as maiores de capital fechado, e o resultado de seu trabalho está no livro Capitalismo de Laços - os donos do Brasil e suas conexões.
O trabalho mostra como foi intenso o avanço do Estado - não mais diretamente por meio do Tesouro Nacional, mas com o uso de empresas como o BNDES e dos fundos de pensão das empresas estatais no capital das companhias privadas.
Em 1996, o BNDES participava, direta ou indiretamente, do capital de 30 grandes empresas brasileiras. Em 2003, primeiro ano do governo Lula, o banco era acionista de 53 empresas; no ano passado, de 90. Somando-se a participação do BNDES e dos fundos de pensão das estatais (além da Previ, também a Petros, dos funcionários da Petrobrás, e a Funcef, dos funcionários da Caixa Econômica Federal, entre outros, investem em ações), o número de empresas privadas com parte do capital detido pelo Estado passou de 72, em 1996, para 95, em 2003, e 119, no ano passado.
O autor do estudo vê aspectos positivos e negativos nesse "capitalismo de laços". As conexões dos controladores privados com o governo permitiram reunir os recursos necessários para grandes projetos, reduzindo o risco para as empresas e assegurando financiamento de longo prazo. Do lado negativo, ele aponta o aumento da influência do governo nas estratégias empresariais e o estabelecimento de canais para o clientelismo no relacionamento entre a iniciativa privada e o poder público.
Há outros aspectos dessa forma de associação que merecem atenção. Cabe destacar, por exemplo, que a escolha de empresas beneficiadas pelo capital estatal - e também por vultosos financiamentos do BNDES - não obedece necessariamente a critérios de políticas públicas destinadas a apoiar o desenvolvimento setorial ou regional, mas resulta de decisões arbitrárias dos gestores dos fundos ou do banco estatal. É dessa prática que surgem as boas relações com o governo de empresários como Eike Batista (Grupo EBX) e Joesley Batista (JBS). Grandes reestruturações empresariais, como a fusão da Sadia e da Perdigão, na área de alimentos, e da Oi e da Telemar, na de telecomunicações, também tiveram forte influência do governo.
A possibilidade de contar com o apoio do Estado reduz as preocupações com a eficiência empresarial, pois, em certos casos, o melhor gestor deixa de ser o mais competente e passa a ser o de melhor relacionamento com o governo. Para o governo, a proximidade com a empresa pode resultar em apoio, até financeiro, a seus planos políticos.
A execução de grandes projetos nos próximos anos, nas áreas de energia elétrica, transportes, esportes e petróleo, entre outros, abre espaço para a expansão do "capitalismo de laços". Como observou Lazzarini à repórter Raquel Landim, do Estado, "em vários desses projetos, já é garantida a participação do BNDES e dos fundos de pensão".
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