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Os planos da Anac

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Por Redação
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Quando se lembra que a redução dos serviços oferecidos pelas companhias aéreas aos passageiros, como mostram experiências no País e no exterior, resulta muito mais no corte dos custos operacionais das transportadoras do que na redução das tarifas pagas pelos usuários - que incorrem em despesa igual, se não maior, por um serviço cada vez pior -, não é difícil saber a quem interessam as mudanças em preparação pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), entre elas o fim do peso mínimo da bagagem.Atualmente, a passagem de voo doméstico dá ao passageiro o direito de despachar 20 quilos, além de levar bagagem de mão. Os autores da proposta de eliminação da obrigatoriedade de um peso mínimo de bagagem alegam que as empresas poderiam oferecer descontos caso o passageiro viaje apenas com itens de mão.Nada impede, pelas regras atuais, que a empresa aérea ofereça esse tipo de desconto. Trata-se de uma estratégia de marketing a que qualquer transportadora pode recorrer, com o objetivo de atrair clientes e, ao mesmo tempo, reduzir o peso por passageiro transportado, o que pode resultar em ganhos operacionais. Quanto menor o peso da bagagem acompanhada maior poderá ser a carga paga transportada. E, se não houver aumento da carga, certamente haverá redução do consumo do combustível.Algumas empresas no exterior reduziram ao máximo os serviços de bordo e limitaram o peso da bagagem por passageiro, oferecendo descontos expressivos no preço da passagem. Elas cobram uma tarifa por bagagem despachada e programam até a cobrança pelo uso dos banheiros do avião. O usuário tem o direito de escolher entre voar por companhias que agem desse modo ou utilizar voos tradicionais.A Anac parece pretender transformar uma eventual estratégia de marketing em política pública. De acordo com reportagem publicada pelo Estado, as mudanças - que incluem também novas normas para a bagagem de mão e a redefinição das multas para a remarcação de passagens - valeriam apenas paras os voos domésticos, pois a franquia de bagagem em voos internacionais é definida pela companhia aérea, de acordo com a regulação de seu país de origem.O superintendente de Regulação Econômica da Anac, Juliano Noman, afirma que, com as normas que ampliaram os direitos dos passageiros, em vigor desde junho, e com o crescimento da demanda doméstica de cerca de 30% em 12 meses, o mercado aéreo atingiu um grau de maturidade que permite discutir as mudanças anunciadas. Mas, mesmo entre as transportadoras, a iniciativa é vista com algum ceticismo. "O brasileiro ainda não está preparado para isso e a aviação tem excesso de regulamentação", disse Adalberto Febeliano, diretor de Relações Institucionais da Azul, controlada por David Neeleman, proprietário da americana Jet Blue, que opera com baixo custo e tarifas menores.Embora reconheça que as mudanças são polêmicas, a Anac está disposta a promovê-las. "Atacamos a questão da assistência (aos passageiros) e agora vamos atacar o que havíamos deixado de lado", afirmou. A agência pretende ouvir empresas e passageiros em audiências públicas.A ocorrência de problemas nas operações aeroportuárias, no entanto, mostra que o atendimento aos usuários do sistema de transporte aéreo nacional está longe da qualidade desejável. Entidades de defesa dos direitos dos consumidores alegam que as multas por deficiência de serviço estabelecidas pela Anac são muito baixas e outras medidas não estão sendo cumpridas. "Descumprir resolução (da Anac) é economicamente vantajoso para as empresas", diz o presidente da Associação Nacional em Defesa dos Direitos dos Passageiros do Transporte Aéreo, Cláudio Candiota.A Anac proclama que um de seus valores é o "compromisso com o interesse público". Não está sendo capaz de assegurar devidamente o interesse dos usuários do transporte aéreo, mas já se propõe a defender o das companhias aéreas. Não foi para isso que ela foi criada.