Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Os problemas do Fies

Com crescimento exponencial da inadimplência nos últimos três anos, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) apresenta graves problemas de sustentação

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Apesar de ter sido reformado há dois anos, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) continua apresentando graves problemas de inadimplência. De 727.522 contratos que se encontravam em fase de amortização, em junho, 416.137 – o equivalente a 57,1% do total – estavam com prestações atrasadas. E como nos três últimos anos a inadimplência cresceu 30 vezes, o montante da dívida é, atualmente, de R$ 20 bilhões, podendo triplicar nos próximos exercícios, segundo estimativas dos gestores do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Além do aumento do número de estudantes inadimplentes, o Fies registra queda de demanda. No vestibular do segundo semestre deste ano, menos da metade dos 50 mil contratos de financiamento oferecidos pelo governo foram firmados. E, no primeiro semestre, apenas 54% dos 82 mil contratos disponíveis com juro zero, cujos recursos vêm da União, foram assinados. A situação é ainda mais grave na modalidade do Fies que usa recursos de fundos públicos e bancos privados. Nos seis primeiros meses do ano, foram firmados 256 dos 105 mil contratos oferecidos.

A queda na procura dessas duas modalidades resulta da crise econômica. Sem perspectiva de colocação profissional, os jovens estão adiando os planos de ingressar no ensino superior, evitando assumir dívidas. Muitos universitários também estão abandonando os estudos por não terem condições de arcar com as parcelas não financiadas da mensalidade e recearem ficar com o nome sujo nos cadastros do serviço de proteção ao crédito. Em média, o Fies financiou 76% do valor das mensalidades, nos primeiros seis meses de 2018.

Segundo levantamento do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Estado de São Paulo, que representa cerca de 100 instituições privadas de ensino superior, o número de calouros matriculados nos cursos presenciais de graduação caiu 5% nos três primeiros meses de 2018, com relação ao mesmo período em 2017.

Por isso, o comitê gestor do Fies anunciou que começará a discutir em outubro um modelo de renegociação com os estudantes inadimplentes, para tentar reduzir o prejuízo. A ideia é adotar parcelas menores e aumentar o tempo para a quitação da dívida.

O Fies foi criado em 1999 pelo governo Fernando Henrique Cardoso e ampliado pelo governo Lula, que afrouxou suas regras, chegando a oferecer crédito farto e barato inclusive a estudantes oriundos de famílias de alta renda. Ampliando ainda mais a oferta pouco criteriosa de empréstimos, a presidente Dilma Rousseff usou o programa como bandeira eleitoral, na campanha pela reeleição.

Àquela altura, muitas universidades privadas chegaram a recomendar a alunos de classe média que, como a taxa de juros do Fies era baixa, assinassem um contrato de financiamento estudantil e aplicassem suas poupanças no mercado financeiro, desfigurando com essa proposta o caráter social do Fies.

Só em 2014 foram concedidos mais de 730 mil novos financiamentos. Após a posse do presidente Michel Temer, em 2016, o Ministério da Fazenda publicou um documento criticando a “ausência de sustentabilidade fiscal” do programa e mostrando que seus custos já superavam o orçamento anual do Bolsa Família.

Para reverter esse quadro, o governo reduziu as obrigações da União, autorizou parcerias com instituições financeiras privadas, aumentou a responsabilidade das universidades particulares nos casos de inadimplência e ampliou as exigências para concessão de financiamento.

Além disso, determinou que, para assinar um contrato de financiamento, os estudantes tivessem no mínimo 450 pontos e não zerassem na redação do Exame Nacional do Ensino Médio. Essas medidas de austeridade, no entanto, não foram capazes de reduzir a inadimplência bilionária, o que exigiu novos acertos no Fies. Parte desses problemas simplesmente não estaria ocorrendo se os governos de Lula e Dilma Rousseff não tivessem desfigurado o Fies, por razões eleiçoeiras.