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Partido estranho

Em geral, e muito especialmente em ano eleitoral, o Poder Legislativo é parte do problema do desequilíbrio das contas públicas, aumentando despesas e concedendo novas desonerações tributárias

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Por Redação
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Na quarta-feira passada, durante votação do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019, o líder do PSDB na Câmara, deputado Nilson Leitão, informou que o partido não teria um posicionamento oficial a respeito da proibição de reajustes para servidores públicos no ano que vem. O PSDB liberou a bancada para que cada parlamentar votasse como bem entendesse. Dos 25 deputados do partido que participaram da votação, 20 manifestaram-se a favor da permissão de aumento para o funcionalismo. Houve uma abstenção, e apenas quatro deputados tucanos apoiaram a proibição do reajuste. Ao fim, com o apoio dos 20 votos dos deputados do PSDB, o Congresso excluiu do texto da LDO de 2019 a proposta favorável à responsabilidade fiscal.

Não é propriamente uma novidade a resistência do Congresso para contribuir com o ajuste fiscal. Em geral, e muito especialmente em ano eleitoral, o Poder Legislativo é parte do problema do desequilíbrio das contas públicas, aumentando despesas e concedendo novas desonerações tributárias. Em muitos parlamentares impera a mentalidade de que a responsabilidade fiscal seria assunto do Poder Executivo. Nessa equivocada visão, promover o equilíbrio entre despesas e receitas seria tarefa apenas do Palácio do Planalto.

A irresponsabilidade fiscal do Legislativo é um dos grandes problemas nacionais. O estranho é que o PSDB queira fazer parte do problema.

O objetivo da restrição de aumento do funcionalismo era facilitar o ajuste fiscal de 2019. Vê-se, assim, que a maioria dos deputados do PSDB não está preocupada com as contas públicas do ano que vem. Além de desmentir o que o pré-candidato à presidência da República Geraldo Alckmin, presidente do PSDB, tem anunciado, a conduta dos 20 deputados tucanos afronta o ideário e a história do partido. As lideranças tucanas nos dois governos de Fernando Henrique conhecem como poucos o quão difícil é promover um mínimo de racionalidade na administração pública. Foram anos de esforço para que fosse aprovada, por exemplo, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000), e agora duas dezenas de deputados cedem diante de arroubos corporativistas.

Não se pode nem dizer que essa concessão ao aumento do funcionalismo foi feita em razão da proximidade das eleições, para agradar ao eleitorado. Animou apenas as corporações públicas. A imensa maioria dos brasileiros, que vive uma situação bem diferente da dos funcionários públicos, será prejudicada com a medida do Congresso.

Diante da atual situação do País – segundo os últimos dados do IBGE, há 13,2 milhões de brasileiros desempregados –, não faz o menor sentido assegurar na LDO a possibilidade de aumento para servidores públicos em 2019. Não resta dúvida de que, no momento, o grupo de pessoas mais imune às consequências da crise econômica e social é o funcionalismo público. Definitivamente, não é com ele que o Congresso precisa se preocupar.

O PSDB tem uma história a honrar e, se deseja ter um futuro condizente com a estatura de seus fundadores, não pode se dar ao descalabro de ser irresponsável com o País. Não cabem flertes com o corporativismo e tampouco com o populismo. Ainda que, em alguma circunstância, a defesa do interesse público leve o partido a uma posição minoritária no Congresso, é imprescindível não transigir com o que é manobra de uns poucos em detrimento da coletividade.

A política é a arte do possível e, para a construção dos necessários consensos no Congresso, é preciso abdicar de ingenuidades e de radicalismos teóricos. Justamente por isso, as negociações não devem perder de vista a realidade. A todos é evidente que, com a atual situação fiscal do País, não há recursos disponíveis para conceder, em 2019, aumento de salário aos funcionários públicos. A submissão gratuita dos 20 deputados tucanos a pressões corporativistas é um fenômeno realmente estranho. Se o partido que defende a responsabilidade fiscal também é irresponsável, o que se salvará?