09 de dezembro de 2013 | 02h06
Populista competente e estritamente pragmático, como na verdade sempre foi, desde os tempos de sua militância sindical, Lula sabe muito bem que é preciso dizer o que o povo quer ouvir. Bolsa Família e promoção de 40 milhões de brasileiros à classe média já não são mais novidade. Ao contrário, são conquistas a esta altura com toda razão consideradas direito adquirido. O brasileiro quer mais. Mas quer, sobretudo, garantir o que já conquistou. E ninguém, nem o mais otimista manipulador de índices econômicos ou formulador de contabilidade criativa põe a mão no fogo pelo que se pode esperar mais à frente.
Nas voltas que o mundo dá, a surpreendente e ruidosa mudança de comportamento de Lula e do PT a respeito do mensalão pode fornecer uma pista sobre o que ele tem na cabeça quando pensa no futuro.
Apesar de arreganhos esporádicos e isolados durante todo o longo processo de julgamento do mensalão e o ano inteiro que precedeu à decretação das primeiras prisões e o encarceramento de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares (os demais para eles não interessam), Lula e seu partido (incluindo, principalmente, a equipe do governo Dilma), mantiveram uma atitude rigorosamente discreta a respeito do processo. Era um comportamento que parecia se justificar pela suposição de que, às vésperas do próximo pleito presidencial, era mais prudente fingir que nada estava acontecendo, varrer o lixo para debaixo do tapete, de modo a não contaminar a campanha pela reeleição de Dilma. Afinal, o povo tem memória curta e quanto mais cedo parar de falar de mensalão, melhor.
Mas, a partir de 15 de novembro, quando a trinca de líderes petistas foi colocada atrás das grades, tudo mudou. Talvez contrariando o que Lula e o comando partidário deles esperavam, Dirceu e Genoino, declarando-se "presos políticos", promoveram uma ruidosa espetacularização política do episódio, em que não faltaram a exibição de punhos revolucionariamente cerrados, além da exploração das condições de saúde de Genoino. Foi o que bastou para botar fogo na militância, que explodiu nas redes sociais em manifestações de indignados protestos contra a "injustiça" cometida por uma Suprema Corte em que 8 de seus 11 integrantes foram nomeados pelos governos petistas.
Até então, o assunto mensalão estava oficialmente interditado no PT. Agora, virou tema do 5.º Congresso do partido que se reunirá a partir do dia 12 em Brasília. Com a participação de Lula, haverá um "ato de desagravo" aos "companheiros injustiçados". Será o partido no poder declarando guerra a um dos Poderes do Estado.
A guerra, contudo, terá um objetivo mais amplo e difuso, um inimigo mais "poderoso", normalmente referido como "eles" ou a "elite", onde se enquadram a "mídia de direita" os "detentores do poder econômico" (exceto, é claro, os empresários amigos escolhidos pelo governo para se tornarem "campeões") e todos aqueles que não são petistas.
Esses são o inimigo. E essa gente má pode muito mais do que condenar injustamente companheiros amigos do povo. Pode sabotar a economia, acabar com o Bolsa Família e fazer muitas outras malvadezas. Contra essa gente má é que Lula está pensando em 2022. É mais do mesmo, claro. Mas, até agora, funcionou.
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