08 de fevereiro de 2015 | 02h05
O exame crítico dos gastos será um exercício politicamente difícil. Poderá haver muita resistência a cortes dos chamados programas sociais. Tanto na campanha quanto em pronunciamentos nas últimas semanas, a presidente Dilma Rousseff negou a possibilidade desse tipo de corte. São previsíveis, além disso, pressões de grupos partidários e de outros tipos de organização contra qualquer redução desse tipo de dispêndio. Mas, se resistir a essas pressões e apoiar o exame rigoroso de todos os tipos de gastos, a presidente poderá, com quatro anos de atraso, cumprir uma promessa formulada quando foi eleita pela primeira vez. Ao assumir a chefia do governo, ela prometeu cuidar da administração e da qualidade da despesa pública.
O foco da discussão, segundo o secretário executivo do Ministério do Planejamento, Dyogo Oliveira, será precisamente a qualidade do gasto e, como condição preliminar, também dos empenhos orçamentários. Se for possível obter o mesmo resultado com menor dispêndio, o governo deverá agir para tornar mais eficiente o uso de cada real. Não se viu muito esforço desse tipo nos últimos 12 anos, até porque a ideia de eficiência na administração pública foi rejeitada mais de uma vez, no período petista, como neoliberal. Mais que isso: mesmo a ideia de equilíbrio orçamentário foi frequentemente recusada como conservadora e reacionária. No período do ministro Guido Mantega, uma interpretação tosca do pensamento keynesiano foi usada para justificar a gastança e a irresponsabilidade fiscal.
Um bom exemplo de como rever e reordenar o uso do dinheiro público pode ser encontrado em um estudo recente sobre a política habitacional, realizado por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo esse estudo, os créditos são mal geridos e seria possível conduzir o programa com menos calotes e menos subsídios. O controle é falho na faixa 1, destinada a famílias com renda mensal de até R$ 1.600. Nessa faixa, onde se encontram 40% dos contratos, a inadimplência chegou a 20% em outubro, bem acima do padrão médio do sistema bancário, de cerca de 3%.
Além disso, há uma concentração excessiva de contratos no nível mais baixo de prestações (os valores, na faixa 1, ficam entre R$ 25 e R$ 80). Não se considera, segundo a pesquisa, a capacidade de pagamento das famílias. No nível mais baixo, o subsídio pode ultrapassar 95% do valor dos imóveis. Se mais famílias pagassem prestações próximas de R$ 80, poderia haver, segundo o estudo, uma redução de R$ 7 bilhões a R$ 15 bilhões nos subsídios.
Casos escandalosos de desperdício aparecem de vez em quando no noticiário - como a multiplicação de pescadores beneficiários de ajuda nos períodos de suspensão da pesca. Outros desperdícios permanecem ocultos ou meio ocultos, favorecidos pelo descuido na gestão e na seleção de programas e de projetos. Além disso, a vinculação de verbas - para educação e saúde, por exemplo - é um reconhecido estímulo à ineficiência. Discutir esse ponto seria especialmente complicado em termos políticos.
Encontrou algum erro? Entre em contato