18 de dezembro de 2013 | 02h10
A essa lamentável condição foi reduzido o que era um centro de convivência. Para a secretária de Assistência Social, Luciana Temer, aquilo não é uma tenda, mas uma "experiência de autogestão que não deu certo". Segundo ela, a ideia inicial era de que as pessoas fossem para a tenda do Parque Dom Pedro após serem retiradas da Praça da Sé apenas para cadastramentos para tratamento de saúde, assistência e habitação. Mas as pessoas resolveram ficar por lá e, conforme a secretária, quiseram assumir a organização. A Prefeitura teria enviado então material de limpeza e reformado os banheiros, mas "aquilo foi perdendo o pé".
Se a administração pública, com os muitos recursos que tem, não consegue resolver os problemas da população em situação de rua, seria muita ingenuidade acreditar que os próprios sem-teto o fariam. A reportagem do Estado visitou outros dois centros de convivência instalados na zona leste pela gestão anterior para oferecer aos moradores de rua um local onde passar o dia, usar o banheiro e se lavar. Todos "perderam o pé" e o que se percebe é a clara omissão do poder público.
No início dos anos 90, São Paulo tinha 3.392 pessoas nas ruas. Duas décadas depois, o último censo dessa população, realizado pela Fundação Escola de Sociologia de São Paulo (Fesp), indicou a presença de 14.478 indivíduos em situação de rua na capital. A maior parte dessa população vaga pelos distritos da Sé, República, Brás, Santana, Santa Cecília, Vila Leopoldina, Consolação, Bom Retiro, Mooca e Bela Vista. Nesses locais, entidades não governamentais distribuem alimentos, os comerciantes fazem doações e, para quem quer ganhar um dinheiro trabalhando, os bicos são mais frequentes.
O levantamento mostra que atualmente 52,6% da população de rua é formada por paulistanos e 47,4% vieram de outros Estados. Há duas décadas, a situação era inversa.
Os números aumentaram consideravelmente, mas as soluções para esse problema são apenas reeditadas, rebatizadas, sem apresentar nenhum resultado significativo. O pouco que é feito tem sempre caráter emergencial, mas acaba se tornando permanente. Os hotéis sociais, surgidos na gestão Marta Suplicy (2001-2004) para abrigar pessoas retiradas de áreas de risco, por exemplo, voltaram a ser a solução para desabrigados no governo Gilberto Kassab. E agora o secretário municipal de Direitos Humanos, Rogério Sottili, novamente anuncia os hotéis sociais como medida de caráter "emergencial".
Impedir a ocupação dos espaços públicos por barracas e casebres construídos com placas de papelão e lona é obrigação da Prefeitura. Mas retirar de lá os moradores de rua sem lhes oferecer a possibilidade de recuperar a autonomia e conseguir emprego não funciona.
Vivendo em condições degradantes, grande parte dessa população perdeu a identidade, a capacidade de convivência em ambiente de trabalho e a civilidade. A quase totalidade teve a saúde mental e física comprometida. Precisa, portanto, muito mais do que uma tenda, de apoio médico, psicológico, de assistência social e profissional. E longe de experiências duvidosas - para dizer o mínimo - de autogestão.
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