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Perseguição política

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Por Redação
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Neste país em que os cidadãos que tiveram seus direitos feridos nem sempre dispõem de tempo ou condições materiais para pôr cobro a injustiças que suportaram, o caso de Eduardo Jorge Caldas Pereira, ex-secretário-geral da Presidência da República no governo Fernando Henrique Cardoso, é um exemplo bem-sucedido de pertinácia para recuperar direitos constitucionais que lhe foram subtraídos por autoridades. O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) reconheceu, na quarta-feira (dia 17), que os procuradores Luiz Francisco de Souza e Guilherme Schelb, de fato, moveram perseguição pessoal, motivada por razões políticas, contra Eduardo Jorge. Em maio de 2007, o relator do CNMP, conselheiro Hugo Cavalcanti, já havia julgado a representação disciplinar apresentada por Eduardo Jorge contra aqueles procuradores e entendido que eles deveriam ser punidos por sua atividade política. Deixou, no entanto, de reconhecer a alegada perseguição. Naquela época, o Conselho determinara a aplicação de pena de suspensão para Luiz Francisco, por 45 dias, e de censura a Shelb. Mas Luiz Francisco fora punido pela gravação clandestina que fez do senador Antonio Carlos Magalhães - no episódio em que este admitia ter violado o painel de votações do Senado - e por ter participado de evento partidário em uma igreja na Candangolândia (DF) em 2002. Eduardo Jorge, então, apresentou ao CNMP embargos de declaração para que fosse acrescentado ao acórdão, especificamente, como outro motivo da representação disciplinar contra os procuradores, a perseguição política de que havia sido vítima. Seu argumento foi acatado e a perseguição política, movida pelos dois procuradores, foi devidamente confirmada - sendo mantidas, contudo, as penalidades que já lhes haviam sido aplicadas. Luiz Francisco obteve, no Supremo Tribunal Federal (STF), por decisão do ministro Joaquim Barbosa, uma liminar suspendendo a punição - estando para ser julgado no Supremo o mérito da decisão do CNMP. De qualquer maneira, é alentador que os Conselhos Nacionais, tanto o do Ministério Público como o da Justiça, venham quebrando vetustas barreiras corporativas, admitindo as falhas estruturais e os erros dos membros de suas instituições, buscando corrigi-los e impor a disciplina - medidas só possíveis através de órgão de controle externo. Recorde-se que o ex-secretário do governo Fernando Henrique acusou o procurador Luiz Francisco de Souza de vazar para a imprensa informações obtidas com a quebra de seus sigilos e que, portanto, deveriam permanecer sob segredo de Justiça. Alegou também que os procuradores teriam passado, à Receita Federal, informações falsas a seu respeito. Além disso, durante longo período Eduardo Jorge ocupou um espaço permanente no noticiário, repleto de denúncias nunca provadas, mas demolidoras de sua imagem pública e reputação. Por sua vez, o procurador Luiz Francisco notabilizou-se, com o apelido de "Torquemada", como um polêmico membro do Ministério Público, tendo sido alvo de dezenas de denúncias e sofrido processos administrativos por parte da Corregedoria-Geral do Ministério Público Federal, que correm sob segredo de Justiça por exigência da Lei Orgânica do Ministério Público. Tido como implacável fiscal do governo FHC, descobriu-se depois que sua "alta produtividade" tinha uma explicação singular: ele assinava ações, denúncias e representações, que já lhe chegavam prontas, dos adversários do governo. O Consultor Jurídico lembra, por exemplo, o caso da ação que o procurador subscreveu, contra um banqueiro, elaborada no gabinete de um de seus concorrentes. Em outra situação esdrúxula, o procurador Luiz Francisco tentou livrar da prisão o embaixador das Farc - a organização terrorista colombiana - no Brasil, Francisco Antonio Cadena Colazzos, o Padre Medina, mesmo sem ter qualquer participação no processo. Não resta dúvida de que esse procurador contribuiu, decisivamente, para que a sociedade brasileira se desse conta da necessidade de estabelecer controles à ação dos que têm a função de fiscalizar e cobrar o respeito à lei - já que nem todos estão imunes às distorções ditadas pelo engajamento político, quando não por reles má-fé.