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Por que a China assusta

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Por Redação
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Dependente da China como um país colonial depende da metrópole, o Brasil tem motivos especiais para se assustar quando a economia chinesa lança algum sinal de alarme. Com importações no valor de R$ 18,47 bilhões nos primeiros seis meses deste ano, o mercado chinês garantiu 19,6% da receita comercial brasileira. Com isso a China se manteve como principal destino das exportações do Brasil, embora o valor tenha sido 22,6% menor que o de um ano antes.

Essa redução já é muito ruim e qualquer indício de maior problema pode ser muito preocupante. O sinal de alerta voltou a soar ontem, quando o principal índice de ações da Bolsa de Xangai caiu 8,5%. Foi a maior queda em oito anos. Cerca de dois terços dos papéis listados nas bolsas caíram até o limite diário de 10%. Desde junho as companhias chinesas listadas em bolsa perderam cerca de US$ 3 trilhões de valor de mercado, mas a intervenção do governo, com injeção de US$ 120 bilhões, havia garantido alguma calma por várias semanas. 

Com a nova queda na China, a tensão contaminou os mercados de todo o mundo e o recuo do Ibovespa, no pior momento, chegou a 1,18%. Na Europa, as bolsas fecharam no vermelh0, enquanto as americanas iniciavam a sessão em queda. Para atenuar a inquietação, o governo chinês acabou anunciando a intenção de manter o suporte às bolsas.

Rumores sobre o abandono dessa política haviam reforçado o nervosismo. Qualquer notícia negativa poderia desencadear uma nova corrida às vendas de papéis. O mercado chinês tornou-se particularmente inseguro com o aumento da participação de famílias de trabalhadores, estimuladas a investir em ações. Muitas se endividaram para entrar no jogo. Por isso, problemas sérios nas bolsas poderão afetar perigosamente outras áreas da economia. 

A nova notícia ruim apareceu nas contas das grandes indústrias. Em junho seu lucro foi 0,3% menor que o de um ano antes. No mesmo tipo de comparação, os relatórios haviam mostrado aumentos de 2,6% em abril e 0,6% em maio. Na pior hipótese, esses números indicariam uma tendência de redução gradual dos ganhos industriais, mas há pouca base, por enquanto, para essa conclusão. Na primeira estimativa, o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre foi 7% maior que o de um ano antes. As estatísticas até agora conhecidas apontam uma economia ainda vigorosa, em acomodação gradual a um ritmo mais baixo de crescimento. 

Essa mudança de ritmo é parte de um programa oficial de reformulação do estilo de crescimento. Pelas novas estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI), a economia chinesa deve crescer 6,8% em 2015 e 6,3% em 2016. 

Mesmo com essa acomodação a China se manterá entre os países mais dinâmicos do mundo, perdendo a liderança, na Ásia, apenas para a Índia. Mas a mudança de ritmo da atividade chinesa poderá – apesar da preservação de invejável dinamismo – afetar o mercado global de matérias-primas e de produtos semielaborados. Isso terá um custo para os países acostumados, por muitos anos, a suprir a enorme demanda chinesa de insumos básicos. Brasil, Argentina, Austrália e vários sul-americanos compõem esse grupo. A redução da demanda chinesa afeta esses países diretamente – pelo volume de vendas – e indiretamente – pelo efeito depressivo sobre os preços. 

A dependência brasileira do mercado chinês é particularmente grave. Neste ano, até junho, o Brasil exportou só US$ 597,55 milhões de manufaturados para a China, 3,23% do valor vendido para lá. Somados os semimanufaturados, chega-se ao total das vendas industriais: US$ 2,82 bilhões, 15,26% da soma total. As vendas de industrializados para os Estados Unidos, de US$ 8,97 bilhões, foram 75,18% do valor exportado para o mercado americano. Isso inclui US$ 6,85 bilhões de manufaturados. A China é um excelente mercado para muitos países. Para o Brasil, funciona como metrópole colonial. Isso torna muito assustador qualquer sinal de enfraquecimento do mercado chinês.