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Pretensões irrealistas

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Por Redação
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Na semana em que o governo concentrou seus esforços políticos na tentativa de convencer os congressistas a aprovar os cortes de despesas indispensáveis para ajustar o Orçamento à queda da arrecadação, cobrir os juros da dívida pública e assegurar a meta de superávit primário de 1,2% do PIB, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, defendeu novo reajuste salarial para magistrados e serventuários judiciais.

“Nós precisamos sempre de reajuste salarial. Quem não precisa pagar o supermercado, já que houve um aumento do preço dos produtos?”, disse ele em solenidade no Tribunal de Justiça de São Paulo, esquecendo-se de que o objetivo do ajuste fiscal proposto pelo governo é justamente reduzir as pressões inflacionárias, a fim de que os preços possam permanecer estáveis não apenas para juízes e escreventes, mas para todos os brasileiros.

Além do pedido de reajuste salarial, o presidente do Supremo defendeu a aprovação, pelo Congresso, do projeto que reestrutura cargos do Poder Judiciário e que, entre outras medidas, prevê a progressão funcional na carreira – acompanhada, evidentemente, de benefícios financeiros. “É um plano orgânico, sistêmico, que permite não apenas a recuperação das perdas salariais, mas também melhor gestão desse imenso número de servidores, em prol de uma prestação jurisdicional mais ágil”, disse Lewandowski.

Se for aprovado, esse “plano orgânico e sistêmico” terá – somente em 2015 – impacto de R$ 1,5 bilhão num orçamento que está sendo contingenciado pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, obrigando universidades federais, hospitais e demais órgãos e autarquias da União a cortar gastos, rever contratos e suspender investimentos. Em nota enviada para o Senado, o Ministério do Planejamento informa que o projeto custará R$ 27,5 bilhões para os cofres públicos nos próximos quatro anos.

Além de reivindicar o reajuste para magistrados e serventuários judiciais e a aprovação de mais um plano de cargos e carreiras para o Judiciário, o presidente do Supremo quer discutir com o governo um plano emergencial para recomposição de perdas salariais. “Compreendemos que vivemos um momento econômico difícil e que há uma crise que reverbera no Brasil”, afirmou Lewandowski, lembrando que seus colegas de instituição estariam dispostos a receber de forma escalonada, “em quatro ou cinco anos”, os aumentos salariais propiciados pelo plano de cargos e o pagamento das perdas causadas pela inflação.

Esses pedidos, neste momento, dão a dimensão do irrealismo do Poder Judiciário, cujos magistrados e serventuários têm remuneração muito superior à dos servidores do Poder Executivo, em todos os níveis hierárquicos. Para tentar lembrar às entidades sindicais dos tribunais que os Três Poderes são autônomos, mas que o Orçamento da União é único, o cofre é um só e a responsabilidade sobre a alocação orçamentária de todo dinheiro que entra e de todos os recursos que saem é do Executivo, o Ministério do Planejamento distribuiu nota oficial informando que, desde 2006, os integrantes do Judiciário já obtiveram reajustes acima da inflação.

A nota também lembra que, para disciplinar a política salarial dos Três Poderes a partir de 2016, será estabelecido um teto para as despesas de pessoal no Orçamento da União e que as negociações dos reajustes das carreiras do Judiciário terão de seguir a sistemática dos demais servidores federais. “O cenário de ajuste fiscal impõe esforços coletivos de todos os Poderes”, diz a nota, depois de reconhecer que as reivindicações corporativas de juízes e serventuários judiciais afetam “severamente o esforço de reequilíbrio fiscal em curso”.

A imposição desse teto representará um grande avanço. Atualmente, na falta de uma política salarial geral para todo o funcionalismo, com parâmetros objetivos que regulem os níveis de salários e negociações em todo o setor público, cada um dos Poderes faz o que bem entende. É por isso que o Judiciário se tornou uma instituição cara e inchada. E presta serviços com muita morosidade.