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Promessas eleitorais

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Por Redação
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O célebre aforista inglês Samuel Johnson (1709-1784) disse certa vez que nada concentra a mente tanto quanto a iminência da morte. O risco de perder uma eleição não há de ficar muito atrás. Desde que essa possibilidade, embora ainda remota, começou a se acercar do Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff passou a focalizar os obstáculos à conquista do segundo mandato - a esqualidez da economia, o inchaço dos preços e os atritos que ameaçam degenerar em fraturas expostas na relação do governo petista com o seu principal aliado político, o PMDB, maior partido brasileiro.Em movimentos destinados a dissipar a imagem cada vez mais negativa de sua aptidão para conduzir o Executivo - e os prognósticos pessimistas sobre os efeitos disso para o cenário eleitoral de 2014 -, Dilma resolveu, com quase um ano de atraso, dar prioridade ao programa de concessões na área de infraestrutura; deixar de lado as suas objeções à alta de juros para combater a inflação, apoiando a decisão do Banco Central de elevar a taxa básica a 8%; e mudar a sua interação com o Congresso, cujas duas Casas estão em mãos peemedebistas. Nas últimas semanas, esse relacionamento degringolou. Desde o boicote insuflado pela liderança da legenda na Câmara dos Deputados ao texto original da Medida Provisória (MP) dos Portos, a que se seguiu a decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros, de não colocar em votação a MP da redução das contas de luz - porque a recebera menos de sete dias antes de sua perda de validade -, o respeito pelo Planalto entre os políticos da própria base governista entrou em queda livre. Até mesmo a presidente sem jogo de cintura, que se julga todo-poderosa e dona da verdade, acabou entendendo o imperativo de reverter o seu desprestígio, agravado pelos números diminutivos da economia, junto à tigrada que só tem compromissos com os seus apetites. Ainda mais em tempos de campanha sucessória antecipada.Na segunda-feira, finalmente, Dilma se dispôs a ouvir o presidente da Câmara, Henrique Alves, e o seu colega Calheiros. O encontro foi intermediado pelo vice peemedebista Michel Temer, de quem os correligionários andam dizendo que precisa ser menos vice e mais peemedebista. Alves saiu da reunião com duas promessas para contar. Em primeiro lugar, nenhum projeto importante seguirá para o Congresso antes de ser discutido com os líderes da base. O procedimento será inaugurado pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Dilma o incumbiu de explicar aos aliados o projeto de reforma do Código de Mineração, a ser encaminhado em regime de urgência constitucional. Nesses casos, a Câmara e o Senado têm, cada qual, 45 dias para votar a matéria, sob pena de trancamento das respectivas pautas.O outro compromisso que teria sido assumido por Dilma foi de economizar nas medidas provisórias. De início, a intenção do Planalto era baixar uma MP para a mineração. Trata-se de um instrumento que de há muito deixou de ser usado apenas em casos de "relevância e urgência", para os quais foi concebido. Serve, a rigor, para tornar o Congresso caudatário do Executivo em matéria da produção de leis. Para ter ideia do uso abusivo da modalidade, só nesses cinco primeiros meses do ano a presidente assinou 15 MPs. Desde a sua posse, em janeiro de 2011, foram 96. Lula, o seu antecessor e patrono, editou 414 (o equivalente a 52 em cada ano de seus dois mandatos, em números arredondados). No caso de Fernando Henrique, em igual período, tinham sido 334, ou 42 por ano, em média.O presidente da Câmara que tinha prometido aos companheiros de bancada expor a Dilma "a verdade" sobre as dificuldades do governo no Congresso o fez pelo menos à saída do Planalto. Ao dizer que a presidente está "muito disposta" a melhorar a interlocução com o Legislativo, emendou: "Todos sabem que os culpados pelo tensionamento não são as ministras Gleisi (da Casa Civil) e Ideli (das Relações Institucionais)". Resta saber se a culpada conseguirá domar o seu estilo centralizador, temperamento autoritário e inaptidão política para fazer as vontades do PMDB. Eleições concentram as mentes, mas talvez não mudem as almas.