27 de outubro de 2012 | 03h07
O repasse de dinheiro a bancos federais intensificou-se a partir da primeira fase da crise internacional, em 2008-2009. Esses aportes, segundo o governo, deveriam servir para a reativação da economia por meio da expansão do crédito. O Programa de Sustentação de Investimentos, destinado a apoiar as operações do BNDES, teria curta duração, segundo se anunciou. Seria mantido apenas como instrumento de suporte à economia afetada pela recessão nos grandes mercados desenvolvidos. A promessa foi esquecida, no entanto, e o programa se manteve.
O Tesouro Nacional vem-se endividando tanto para capitalizar diretamente as instituições federais quanto para ajudá-las por meio de empréstimos - de fato, transferências sem volta. Em 2012 já foram entregues R$ 61,1 bilhões ao BNDES, ao Banco do Brasil e à Caixa. Mais R$ 20 bilhões para o BNDES foram programados para este mês.
Na prática, o Tesouro vem operando como se fosse um grande fundo bancário. Isso ultrapassa amplamente as funções adequadas ao principal órgão gestor dos recursos fiscais. Como a União é acionista daqueles bancos, cabe ao Tesouro participar das operações de capitalização, nos momentos adequados. Não lhe cabe, no entanto, alimentar o caixa dessas instituições por meio de empréstimos, e muito menos de empréstimos de retorno altamente duvidoso.
Com essa orientação, o governo restabelece perigosa promiscuidade entre o Tesouro e os bancos oficiais. Essa relação perigosa foi aceita como normal durante longo período. As consequências foram desastrosas para as contas públicas, para a política monetária e, naturalmente, para os preços.
A alimentação do crédito oficial com recursos do Tesouro contribuiu para o descontrole inflacionário e para a desordem monetária e fiscal dos anos 80. Um primeiro passo para a reorganização da economia nacional foi dado no final daquela década, com a extinção da chamada conta movimento, o canal de transmissão dos recursos. Pelo menos esse problema estava resolvido, quando se lançou, em 1994, o Plano Real.
A crescente promiscuidade entre o Tesouro e os bancos federais é um perigoso retrocesso. É uma das manifestações do voluntarismo característico da atual política econômica. Esse estilo de administração se tornou mais evidente a partir do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e foi mantido na atual gestão.
A política voluntarista prejudicou a gestão e os planos da Petrobrás, desorganizou os preços e afetou o mercado de combustíveis. O mesmo padrão é seguido pelo governo, hoje, em vários setores da gestão econômica - na impropriamente chamada política industrial, na política monetária, cada vez mais dependente da orientação do Palácio do Planalto, e, de novo, na administração das estatais.
Não se desorganiza uma economia de um dia para o outro. Mas o resultado é certo, quando a visão de curto prazo começa a comandar os domínios da ação de governo, a começar pela política fiscal. Já não há dúvida quanto ao abandono dos vetores mais importantes da gestão macroeconômica - as metas de inflação, o compromisso com o resultado primário das contas públicas e o câmbio flutuante. A insistência no uso do Tesouro como instrumento da política de crédito reforça essa tendência.
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