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Qual política agrária?

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Por Redação
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Se, na chefia do Ministério do Desenvolvimento Agrário, o deputado Afonso Florence (PT-BA) mereceu o agradecimento da presidente Dilma Rousseff, "por sua importante colaboração à frente da pasta", e ainda teve o reconhecimento formal e explícito pela Presidência da República de que "prestou grandes serviços ao processo de inclusão social no campo" e "participou de ações que fortaleceram a agricultura familiar e ajudaram a melhorar a vida de milhares de brasileiros", por que ele foi demitido do cargo, e de maneira por ele tão inesperada?Ao noticiar a demissão de Florence, a imprensa rememorou as críticas à sua gestão. Há tempos os movimentos sociais ligados aos trabalhadores rurais partidários da distribuição de terras a qualquer preço vinham se queixando do que consideram a inoperância da pasta e do abandono gradual, pelo governo, dos compromissos históricos do PT com a reforma agrária. Números oficiais recentemente divulgados, com o registro de 22.021 famílias assentadas em 2011 dentro do programa de reforma agrária - o menor dos últimos 16 anos -, deram novo e forte argumento para os críticos. O Núcleo Agrário do PT na Câmara, formado por 14 deputados, anunciou na semana passada que cobraria do governo mudanças nesse quadro e a reafirmação na prática da prioridade para a reforma agrária.Foi para rebater as críticas ao mau desempenho do Ministério do Desenvolvimento Agrário, reiteradas após o anúncio da demissão, que o Palácio do Planalto divulgou uma segunda nota oficial sobre o episódio - na primeira, protocolar, anunciou a demissão e agradeceu a colaboração do ex-ministro. A nova nota procurou mostrar a eficiência da gestão de Florence, cujos préstimos, porém, o governo dispensava sem nenhuma cerimônia.É provável que, com a substituição de Florence pelo deputado Pepe Vargas (PT-RS) - da mesma corrente partidária do ministro demitido, a Democracia Socialista, mas da ala gaúcha, o que faz a bancada sulista do partido retomar o Ministério que vinha ocupando desde sua criação, em 2003 -, o governo procure dar uma satisfação aos petistas e militantes dos movimentos sociais que vinham criticando sua política agrária. Especula-se também que, para a substituição de Florence por Vargas, pode ter contribuído a necessidade do governo de recompor a aliança com o PMDB, pois o indicado terá de desistir da disputa pela prefeitura do município gaúcho de Caxias do Sul, o que abre caminho para uma candidatura peemedebista.Quaisquer que tenham sido os motivos que levaram a presidente Dilma Rousseff a demitir com frieza política o ministro do Desenvolvimento Agrário, o episódio torna ainda mais difícil de entender qual é, afinal, a diretriz do governo para o Ministério do Desenvolvimento Agrário e para o Incra. Declarações dos responsáveis por essa área mostram que, como em outros programas do governo do PT, a política agrária tem objetivos conflitantes.A drástica redução do número de assentamentos e o fato de o primeiro decreto de desapropriação de terras para reforma agrária ter sido assinado só no fim de dezembro podem ser interpretados como demonstrações de inoperância, ineficiência ou incompetência pura e simples. Isso justificaria a demissão de Florence, apesar dos elogios que ele mereceu da presidente.Mas podem ser também sinais de mudança, para melhor, da política agrária do governo, que estaria voltada não mais para o registro de números crescentes de novos assentamentos, mas para a melhoria das condições de vida e de trabalho das famílias assentadas, com a oferta de treinamento e educação, necessários para o aumento da produtividade, e da infraestrutura, necessária para o escoamento da produção dessas famílias.Ao declarar que é preciso acelerar os assentamentos, mas sem ignorar a necessidade de oferta de infraestrutura, o ministro indicado Pepe Vargas apenas reafirmou a contradição existente no governo a respeito da política agrária. É preciso aguardar suas ações e decisões para saber como será sua política.