11 de janeiro de 2015 | 02h03
Antes de completar uma semana, seu segundo período já foi marcado por uma constrangedora bronca pública no ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, e por uma polêmica sobre um novo financiamento de R$ 2,5 bilhões para as distribuidoras de eletricidade. A maior parte da herança maldita agora recebida pela presidente foi deixada por ela mesma. A qualidade da herança é conhecida, mas o inventário apenas começou.
Parcela importante dessa herança macabra, cheia de esqueletos, é a perda de potencial de crescimento. Além de ter crescido menos de 2% ao ano, em média, entre 2011 e 2014, a economia brasileira tornou-se anêmica. Entre janeiro e novembro do ano passado a produção industrial foi 3,2% menor que a de um ano antes e a variação acumulada em quatro anos foi certamente negativa. Mas o pior indicador - para a indústria e para a economia em geral - é o baixo índice de investimento. Pouco se gastou na ampliação e na modernização da capacidade produtiva e isso será um obstáculo a mais à retomada da expansão.
A fabricação de máquinas e equipamentos, isto é, de bens de capital, foi até novembro 8,8% menor que nos meses correspondentes de 2013. Além disso, em 2014 foram gastos com a importação de bens de capital US$ 47,72 bilhões, 7,6% menos que no ano anterior, pela média dos dias úteis.
Esses números são compatíveis com o baixo grau de confiança apontado pela última sondagem de investimentos da Fundação Getúlio Vargas, divulgada em dezembro. No quarto trimestre de 2013, 47% dos empresários industriais indicaram disposição de investir mais no ano seguinte. No fim do ano passado, 38% reportaram aumento efetivo do investimento e 31%, diminuição. A disposição de ampliar os programas em 2015 foi apontada por 41% dos consultados, mas só 45% dos informantes declararam certeza quanto à execução dos planos neste ano. Empresários de serviços, comércio e construção também relataram baixos níveis de investimento e mostraram muita insegurança em relação a 2015.
No terceiro trimestre, o empresariado e o governo aplicaram em máquinas, equipamentos, instalações e obras de infraestrutura o equivalente a 17,4% do produto interno bruto (PIB). Um ano antes a proporção havia sido 19%. Quando se consideram apenas os terceiros trimestres, a taxa mais alta desde o ano 2000 foi alcançada em 2008. Nesse período a formação bruta de capital fixo - nome técnico da aplicação de recursos em máquinas e outros meios físicos de produção - chegou a 20,7%. A partir de 2010, declinou de forma quase contínua, com algumas pequenas oscilações.
A taxa brasileira de investimentos é menor que a dos países mais dinâmicos da região, como Chile, Colômbia, Peru e Equador, e muito mais baixa que a das economias mais competitivas da Ásia. Desde o período Lula o governo anuncia o compromisso de elevar essa taxa para 24% do PIB. Mas os números efetivos têm ficado sempre muito distantes dessa meta. Quando o Brasil chegar lá, alcançará padrões já observados há alguns anos em outras economias da América Latina.
Mas nem o baixo investimento registrado no Brasil é financiado com poupança interna. No terceiro trimestre o País poupou o equivalente a apenas 14% do PIB. A diferença foi coberta com recursos externos. A taxa de poupança também declinou a partir de 2008, quando havia chegado a 20,6%, e a queda acelerou-se a partir de 2010. A queda mais veloz coincidiu com a deterioração das contas públicas, isto é, com a redução do resultado primário, destinado ao pagamento parcial dos juros.
Nesse período, o déficit nominal do setor público em todos os níveis - resultado geral das contas de governo, incluído o gasto com juros - aumentou rapidamente e atingiu R$ 297,4 bilhões, 5,82% do PIB, nos 12 meses até novembro. Também nesses 12 meses, o buraco nas contas do governo federal - Tesouro e INSS - chegou a 5,1% do PIB. Para facilitar a avaliação: o déficit fiscal da Itália, no terceiro trimestre, correspondeu a 3,7% do PIB e foi pouco maior que o de um ano antes, 3,4%.
Por mais de uma razão o conserto das contas públicas, atribuído principalmente ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é condição para a retomada segura do crescimento. O ajuste deve levar a um aumento da poupança do governo e a uma elevação do investimento público. Deve possibilitar, além disso, um combate à inflação mais eficiente e menos dependente de juros altos.
No ano passado, a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) chegou a 6,41% e quase bateu no limite de tolerância, 6,5%. Para este ano o mercado projetou, no início de janeiro, 6,56%, mas a expectativa poderá melhorar, se o governo se mostrar mais sério que nos últimos anos. Se os empresários se tornarem mais confiantes, poderão investir mais para ampliar a capacidade produtiva e ganhar poder de competição. Nada disso está garantido. Há muitas incertezas, a começar pela disposição da presidente Dilma Rousseff.
JORNALISTA
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