Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Reação à advocacia política

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A situação do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, não é lá muito confortável. Recente pesquisa da União dos Advogados Públicos Federais do Brasil (Unafe) mostrou que 98,65% dos servidores da Advocacia-Geral da União (AGU) rejeitam sua gestão à frente do órgão. A quase unânime oposição a Adams - revelada pela enquete que contou com a participação de 1,4 mil advogados da União, procuradores federais, procuradores da Fazenda Nacional, assistentes jurídicos e procuradores do Banco Central - é resultado de uma condução da AGU em que o político prevalece sobre o jurídico.

Certamente, a rejeição a Luís Inácio Adams foi agravada pelo modo como este atuou junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), na análise das contas de 2014 do governo Dilma Rousseff. A defesa feita pelo advogado-geral da União tinha pouco conteúdo jurídico e muita argumentação política, como mera reprodução dos interesses do Palácio do Planalto. As atribuições da AGU, definidas pela Lei Complementar 73, de 1993, estão em outra ordem. Cabe ao órgão realizar as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos ao Poder Executivo. Segundo o diretor da Unafe, Roberto Mota, “Adams sempre foi extremamente subserviente e envergonha a instituição com o posicionamento apresentado diante do TCU”.

O desconforto com Adams, no entanto, não é de agora. Em agosto de 2012, a presidente Dilma Rousseff apresentou ao Congresso um projeto de lei elaborado pelo advogado-geral da União que causou estarrecimento entre os servidores da AGU.

De acordo com a legislação em vigor, apenas o advogado-geral da União pode ser de fora do quadro de profissionais do órgão. O projeto de lei feito por Adams vinha estabelecer que os postos de procurador-geral da União, procurador-geral da Fazenda Nacional, procurador-geral federal, procurador-chefe do Banco Central, consultor-geral e consultores jurídicos dos Ministérios fossem de livre nomeação do chefe da AGU.

Não contente com essa permissão, o projeto ainda aumentava significativamente os poderes decisórios do advogado-geral da União, esvaziando parte das competências dos advogados públicos concursados. A cereja do bolo era enquadrar como infração funcional o parecer do advogado público que contrariasse as ordens de seus superiores hierárquicos. Não estariam lá para resolver juridicamente as questões, e sim para obedecer ordens. A vontade dos procuradores-chefes, indicados com base em conveniências políticas, teria prioridade sobre o entendimento técnico dos advogados de carreira.

Como se vê, o tal projeto de lei - com a deliberada tentativa de institucionalizar o aparelhamento político da AGU - deve ter sido motivo de grande júbilo no PT. Há muito não se via um projeto que atendesse tão rigorosamente aos interesses petistas.

Também causou constrangimento a atuação de Adams no episódio da vinda do senador boliviano Roger Pinto Molina para o Brasil, em agosto de 2013. O chefe da AGU simplesmente replicou o descontentamento da presidente Dilma com o caso, dizendo que Molina - opositor do amigo do Palácio do Planalto, Evo Morales - teria de formular novo pedido de asilo. Segundo a opinião de Adams, a autorização que o senador boliviano obtivera para permanecer na embaixada brasileira em La Paz não assegurava o direito de permanecer em território nacional. Era mais um episódio em que os ventos políticos sopravam mais forte que as razões jurídicas.

Diante desse histórico, é mais do que esperado o descontentamento dos servidores da AGU com a atuação politicamente orientada de Luís Inácio Adams à frente do órgão. Afinal, eles não estão lá a serviço de um partido ou de uma causa política. Estão a serviço do Estado. No entanto, nem o PT, nem a presidente Dilma, nem o sr. Adams parecem dispostos a compreender essa diferença. Inclinam-se à lógica do vale-tudo.