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Recompor a indústria

A indústria chegou ao fim do ano com nível de produção semelhante ao de fevereiro de 2009

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Por Redação
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A melhor surpresa deste início de ano foi o aumento da produção industrial em dezembro – 2,3% sobre o volume do mês anterior – informada recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Detalhe especialmente animador foi o crescimento observado em 16 dos 24 ramos cobertos pela pesquisa. Não foi, portanto, uma reação concentrada, apesar do peso de alguns segmentos, como o automobilístico. Mas seria arriscado apontar, nesse conjunto de informações, o sinal de uma virada sustentável. Não se pode ainda falar com segurança de uma nova fase de expansão, advertem analistas do mercado e também o técnico responsável pela pesquisa, André Macedo.

Ele aponta a situação da própria indústria automobilística para justificar a cautela: foram fabricados no fim do ano mais automóveis e caminhões, mas os estoques permaneceram acima do nível desejado. Horas depois, a Agência Estado divulgou uma avaliação preliminar das vendas de veículos novos em janeiro. Segundo fontes do setor, o total vendido, de 147.253 unidades, foi 27,9% menor que o de dezembro e 5,2% inferior ao de janeiro de 2016. 

Apesar da cautela recomendável, quem quiser garimpar sinais promissores nos últimos números do IBGE poderá encontrar pelo menos mais uns poucos. A produção industrial havia crescido em novembro (0,4%) e ganhou impulso no mês seguinte. Além disso, o resultado final do trimestre foi positivo, com expansão de 0,5% sobre o anterior. 

Há bons indícios, portanto, mas são ainda muito fracos. Qualquer movimento para cima pode chamar a atenção porque as bases de comparação mensal ou trimestral têm sido muito baixas. Quando se examinam períodos mais longos fica mais claro o tamanho do desastre. Em um ano a produção da indústria geral diminuiu 6,6%. As variações acumuladas em 12 meses são negativas em todas as grandes categorias: bens de capital, -11,1%; bens intermediários, -6,3%; bens de consumo duráveis, -14,7%; bens de consumo semiduráveis e não duráveis, -3,7%. 

Esses dados imediatamente remetem aos principais complementos do quadro. O crédito escasso e caro derrubou a procura dos bens de maior valor, como automóveis e eletroeletrônicos. O desemprego crescente – 12,3 milhões de pessoas no último trimestre – e a erosão da renda familiar prejudicaram a demanda de todos os bens de consumo, incluídos os semiduráveis, como roupas e calçados, e os não duráveis, como cosméticos, artigos de higiene e limpeza e até alimentos mais custosos. 

A perda de renda resultou da combinação de dois fatores, a piora das condições de emprego e a inflação, muito elevada durante a maior parte do ano. A contrapartida dos números da produção industrial é, portanto, uma degradação considerável do padrão de vida de muitos milhões de pessoas – as desempregadas, as dependentes e todas aquelas afetadas mais sensivelmente pela alta dos preços finais. 

Se a inflação, em declínio a partir dos meses finais de 2016, continuar neste ano, será restabelecida uma das condições necessárias a uma recuperação segura do consumo. Mas ainda será indispensável uma melhora da oferta de emprego. Em relação a esse quesito, há quem preveja piora antes do início de uma recuperação. 

A indústria chegou ao fim do ano com nível de produção semelhante ao de fevereiro de 2009. Uma perspectiva de três anos permite uma percepção mais clara da catástrofe produzida pela irresponsabilidade e pela incompetência do governo petista. Em três anos a produção industrial diminuiu 16,9%, a de bens de capital caiu 39,8%, a de bens duráveis encolheu 36,8%, a de semiduráveis e não duráveis ficou 10,3% menor e a perda, no caso dos intermediários, chegou a 13,3%. Mas o recuo foi muito além desses indicadores.

A queda da produção e da importação de bens de capital – máquinas e equipamentos – denuncia uma dramática redução de investimentos no potencial produtivo. A indústria perdeu capacidade de avançar de forma sustentável. Recompor a musculatura do setor industrial será uma das principais tarefas dos próximos anos.