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Recuperar o Jardim Edite

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Por Redação
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Em hipótese nenhuma as autoridades podem tolerar que o tráfico de drogas imponha sua vontade aos moradores da Favela do Jardim Edite. Localizado numa área nobre da cidade, ao lado das Avenidas Jornalista Roberto Marinho e Luiz Carlos Berrini e nas proximidades da Ponte Octavio Frias de Oliveira, sobre o Rio Pinheiros, o Jardim Edite será reurbanizado pela Prefeitura, que ali vai construir dois conjuntos habitacionais para a população de baixa renda, com áreas de lazer e creches. Mas, com ameaças de morte e até sequestros, como mostrou reportagem de Diego Zanchetta publicada na sexta-feira, dia 27, pelo Estado, traficantes vêm intimidando os moradores para que não deixem o local e, assim, impeçam a desocupação da área, indispensável para a execução do programa urbanístico e habitacional da Prefeitura. Os criminosos transformaram a favela num local de venda de drogas para consumidores de renda média e alta que frequentam as casas noturnas dos bairros de Moema e Itaim-Bibi. Não querem perder seu ponto privilegiado, que foi transformado numa espécie de "drive-thru" da droga. A existência desse ponto de venda de drogas foi denunciada em abril de 2006 pelo Jornal da Tarde. As Polícias Civil e Militar fizeram blitze na região e detiveram suspeitos, mas o tráfico voltou a mandar na Favela do Jardim Edite, a ponto de impor a mudança de itinerário de uma linha de ônibus que atrapalhava seu "negócio". A execução da obra pela Prefeitura exige que os moradores da favela deixem o local por, pelo menos, 18 meses. Decisão judicial de abril do ano passado determinou que parte das famílias seja abrigada em imóveis da CDHU no bairro de Campo Limpo. Do total, 83 famílias vivem temporariamente no conjunto da CDHU. Outras 47 optaram pelo auxílio casa própria e 225 ganharam a bolsa-aluguel de R$ 500 mensais. Mas, de acordo com denúncias feitas à Promotoria de Habitação e Urbanismo, os traficantes estão ameaçando os moradores que aceitaram a remoção, mas ainda não mudaram. Para preservar a segurança dos moradores, a promotora Cláudia Beré decretou sigilo nas investigações. Um líder comunitário foi mantido sob o poder dos traficantes por dois dias, para que mudasse sua posição favorável à remoção da favela. Depois desse sequestro, parte das famílias que já haviam aceitado a mudança desistiu de sair da favela. Uma ex-moradora contou à Justiça que foi ameaçada pelos traficantes antes de mudar para o conjunto da CDHU em Campo Limpo. Disseram-lhe que quem saísse de lá deveria "aguentar depois". Um deles tinha um revólver na cintura. Assustada, ela diz que nunca mais voltará para o Jardim Edite. Até funcionários públicos são vítimas da violência dos traficantes. Em nota oficial, a Secretaria Municipal de Habitação (Sehab), responsável pela reurbanização e construção do conjunto habitacional do Jardim Edite, confirmou que houve ameaças a "integrantes da equipe" que faz a remoção dos moradores. Desde junho de 2008, quando começou a remoção das famílias, a Sehab teve de interromper os trabalhos por duas vezes por causa da ação dos traficantes. Houve até o caso de sequestro de uma funcionária municipal, mantida sob a mira de revólveres por mais de dez horas, mas felizmente libertada sem ferimentos. A Prefeitura e o Ministério Público decidiram, então, acionar a Polícia Militar para garantir o trabalho. A remoção deveria ter sido concluída no dia 8 de fevereiro, mas, por causa da ação dos traficantes, o prazo foi estendido para maio, de acordo com a Sehab. É tarefa inadiável das autoridades derrotar o tráfico, não apenas para proteger os moradores da Favela Jardim Edite, assegurando-lhes o direito de decidir sobre seu futuro, e garantir que a Prefeitura de São Paulo execute seus planos para o local, mas, sobretudo, para eliminar, ainda na raiz, qualquer tentativa de estabelecimento de um poder paralelo naquela área. Experiências em outras regiões do País mostram que, uma vez instalado o poder do crime em um núcleo urbano, é difícil removê-lo para restabelecer a autoridade do Estado.