Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Reforma tímida na Bolsa

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

Frustrou-se a tentativa da Bolsa de São Paulo de introduzir mudanças profundas no Novo Mercado - o segmento onde são mais rigorosos os requisitos de governança corporativa. Das 11 propostas apresentadas, as companhias abertas rejeitaram, por ampla maioria, as 3 principais - que criavam um comitê de auditoria, ampliavam o número de conselheiros independentes no Conselho de Administração e impunham uma oferta pública de compra de ações se um acionista ou grupo de acionistas atingisse uma participação de 30% no capital da empresa. Os segmentos diferenciados de governança corporativa (Novo Mercado, Nível 1 e Nível 2) foram criados há dez anos pela Bolsa e propiciaram grandes avanços ao mercado de capitais, ampliando os direitos dos acionistas minoritários e obrigando as empresas a prestar satisfação de suas principais decisões aos investidores. A reforma foi debatida durante dois anos. Os itens aprovados representam um avanço em relação às regras vigentes, mas de muito menor alcance do que pretendia a Bolsa.Foram aprovadas a redução das limitações ao direito de voto dos acionistas minoritários, a elaboração de um código de conduta, a divulgação da política de negociação de valores mobiliários e proibida a acumulação dos cargos de diretor-presidente e de presidente do conselho de administração.Embora intensos, os debates sobre a reforma do Novo Mercado raramente vieram a público. Das 106 empresas participantes do Novo Mercado, 93 se manifestaram e 12 não. A Bolsa, que também é uma companhia aberta, declarou-se impedida de votar. Houve 54 votos contrários à proposta de aumento de 20% para 30% de participação de conselheiros independentes. A criação de comitê de auditoria com três membros, pelo menos um dos quais independente, foi rejeitada por 61 votos. E a obrigação de fazer uma oferta pública de ações foi negada por 60 votos. A maior oposição às mudanças veio das empresas sócias da Associação Brasileira das Companhias Abertas, sob o argumento de que haveria aumento de custos com a contratação de conselheiros independentes. Algumas acreditam que haveria superposição de funções do conselho fiscal e do comitê de auditoria.Conhecidos os resultados da votação, o presidente do Conselho de Administração da Bolsa, Armínio Fraga, disse que a discussão deixou no ar um cheiro "de Brasil velho". As mudanças, a rigor, aproximariam as regras brasileiras daquelas que prevalecem na Europa, onde os investidores são extremamente exigentes.Gestores de recursos como Marcos Duarte, da Polo Capital, reclamaram que os acionistas minoritários não foram consultados pelas empresas abertas. O presidente do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, Gilberto Mifano, afirmou que "as empresas não entenderam bem o espírito das mudanças", pois boa parte delas já contrata mais conselheiros independentes - e esta foi uma das propostas rejeitadas.O pano de fundo para as mudanças do Novo Mercado é a existência de dois tipos de ações nas sociedades anônimas: as ordinárias, com direito de voto nas assembleias, e as preferenciais, sem direito de voto. É possível controlar uma companhia dispondo apenas da metade das ações ordinárias, mais uma ação. O Novo Mercado significou um meio-termo em relação a uma mudança radical, pela qual as ações preferenciais seriam transformadas em ordinárias, o que levaria alguns controladores a perder o domínio da empresa. As empresas que aderiram ao Novo Mercado emitem apenas ações ordinárias e se obrigam a manter no mínimo 25% do capital em circulação, o que cria mercado para as ações e facilita a compra e a venda de títulos pelos acionistas minoritários. A rejeição das mudanças indica que as empresas evitam discutir o controle acionário, mas não deve ser vista como definitiva. Para conseguir o capital de que necessitam para se expandir, elas serão obrigadas a adotar regras cada vez mais atraentes para os minoritários.