
24 de maio de 2011 | 00h00
Nada mais natural que aproveitassem as eleições regionais e municipais de domingo - em que estava em jogo o controle de 8,1 mil cidades e de 13 das 17 comunidades autônomas (Estados) que constituem o país - para se desforrar da agremiação no poder desde 2004. Foi o que também ocorreu, em pleitos nacionais, na Irlanda e em Portugal. O paradoxo espanhol é que a punição premiou o oposicionista Partido Popular (PP), de direita, pró-mercado e favorável ao rigor fiscal, com a sua maior vitória sobre a principal legenda da esquerda espanhola desde a redemocratização da Espanha, em 1978.
O PSOE de Zapatero foi aplastado. Não apenas ficou inéditos 10 pontos aquém do PP (com 28% dos votos, ante 38% do vitorioso), como ainda sofreu derrotas históricas em vários pontos do país. Baluartes socialistas até então inexpugnáveis, como a região administrativa de Castilla-La Mancha, com a sua histórica capital, Toledo, e a cidade de Sevilha, a quarta maior da Espanha, na Andaluzia, onde o desemprego é especialmente alto, foram conquistados pela legenda do ex-premiê Mariano Rajoy. Os socialistas perderam ainda o reduto de Barcelona para a coligação nacionalista catalã de centro-direita CiU, terceira força no Parlamento espanhol.
É óbvio que a maioria votou contra o PSOE, mas não está claro que tenha votado no PP por se identificar com a sua linha. É possível que uma parcela dos espanhóis tenha castigado o governo Zapatero pela gastança que o obrigaria a elevar o endividamento público a níveis críticos e, por isso, a passar a tesoura nos benefícios sociais, agravando a retração econômica e o desemprego. Ou pode ser, prosaicamente, que muitos tenham votado na direita por ser a alternativa mais realista na constelação política do país. Onde esse não era o caso, como na Catalunha, preferiram outra sigla. Assim, os socialistas ficaram prensados entre a frustração do eleitor comum e a ira dos desencantados com a política. E o PP venceu em 11 comunidades autônomas.
Inspirando-se nos milhares de jovens egípcios que acamparam em massa na Praça Tahrir, no Cairo, exigindo o fim da ditadura de Hosni Mubarak e a remoção do ditador, outros tantos espanhóis se instalaram no domingo anterior ao da eleição na Porta do Sol, a principal praça madrilenha e em pontos semelhantes de outras cidades. Denominando-se "indignados" - provavelmente em alusão ao panfleto Indignez Vous!, do ativista e herói da Resistência francesa Stéphane Hessel, que bate recordes de venda em toda a Europa -, os manifestantes se voltam contra os políticos e a política em geral, cujo distanciamento das agruras do povo, a começar do desemprego, atestaria a falência do sistema.
O protesto lembra a palavra de ordem Que se vayán todos, que ecoava na Argentina na virada de 2001 para 2002, forçando a queda de três presidentes em menos de um mês. Mas os eleitores espanhóis não atenderam aos apelos dos indignados para que boicotassem as eleições. O comparecimento, da ordem de 66%, aumentou 3 pontos em relação ao pleito de 2007. Os votos nulos se limitaram a 1,7%. No entanto, como se diz, sobrou para Zapatero. Agora, sob o impacto das urnas e a pressão das ruas, é improvável que o seu governo resista até as eleições parlamentares de março do ano que vem - nas quais, já avisou, ele não se candidatará.
Para o PP de Mariano Rajoy, quanto antes se realizar o novo pleito, menores as chances de que uma eventual recuperação da economia e do emprego reconcilie o eleitor com o PSOE.
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