01 de maio de 2012 | 03h07
Mas, ao retirar do governo a obrigatoriedade do pagamento da remuneração do ex-funcionário durante a quarentena, condicionando esse pagamento a casos excepcionais que serão autorizados pela Comissão de Ética Pública, o projeto aprovado pela Câmara - e que ainda será votado pelo Senado - sujeita os ocupantes de altos cargos públicos, entre eles profissionais originários da iniciativa privada, ao risco de ficar seis meses sem rendimentos.
Essa medida pode ter duas consequências nocivas para a qualidade, a eficiência e a lisura no serviço público. De um lado, confere enorme poder de arbítrio a um órgão cujos membros são nomeados pelo Executivo, e que decidirá quem pode ou não ser remunerado pelo governo durante a quarentena, o que abre caminho para favorecimentos de inspiração político-partidária. De outro, o não pagamento obrigatório durante a quarentena de remuneração equivalente ao da função exercida pode afastar de vez das funções públicas profissionais de reconhecida competência que já não se sentem atraídos por cargos no governo, o que resultaria em perda de qualidade para a administração.
O projeto destina-se a adaptar a legislação brasileira às convenções internacionais às quais o Brasil aderiu, entre elas a Convenção da ONU contra a Corrupção, ratificada pelo Congresso Nacional. Enviado pelo governo em outubro de 2006, o projeto tinha pareceres favoráveis das Comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público e de Constituição e Justiça e de Cidadania desde 2007, mas só no dia 3 de abril passado foi apreciado pelo plenário da Câmara.
Desde sua apresentação, o projeto vinha sendo criticado, entre outros motivos, pelo prazo de um ano para a quarentena, considerado excessivo. O texto original recebeu apenas uma emenda, de iniciativa do deputado Mendes Thame (PSDB-SP), justamente a que reduziu o prazo de quarentena para seis meses.
Durante a quarentena, os ex-funcionários de alto escalão estarão impedidos de prestar serviços a qualquer pessoa ou empresa com as quais tenham tido relacionamento relevante durante o exercício da função; trabalhar para pessoa ou empresa que tenham atividades relacionadas com o órgão para o qual prestaram serviços; e atuar como consultores ou assessores de empresas com interesse em decisões do órgão no qual trabalharam.
O impedimento temporário do exercício de funções remuneradas que possam configurar conflito de interesse se aplica a ex-ministros de Estado; ocupantes de cargos de "natureza especial ou equivalentes"; presidentes e diretores de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista; e ocupantes de cargos de direção e assessoramento superiores, conhecidos no serviço público como DAS 6 e 5.
Com isso, o número de cargos cujos ocupantes estão sujeitos à quarentena passará dos atuais 92 para cerca de 2,5 mil. Se os exonerados desses cargos forem funcionários de carreira, eles retornarão a suas funções originais, com os vencimentos devidos. A justificativa de que a não obrigatoriedade do pagamento dos vencimentos durante a quarentena se deve à necessidade de evitar a expansão dos gastos com o funcionalismo não tem fundamento, pois há formas muito mais eficazes do que essa para se cortar o custo da folha de pessoal.
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