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Sobrou a política de juros

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Por Redação
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Juros altos, desemprego e consumo retraído são os únicos fatores capazes de impor algum freio à inflação nos próximos 12 meses – e esse freio poderá ser muito limitado, se o câmbio pressionar mais fortemente os preços internos. Com o governo travado e incapaz de apontar um rumo e reconquistar a confiança de investidores, consumidores e avaliadores de risco, a política monetária se confirma como único instrumento disponível para conter a disparada dos preços. Nada mais natural, nesse quadro, que a manutenção dos juros básicos em 14,25% pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), na quarta-feira. Se nenhum outro risco fosse detectado, bastaria o forte repique da inflação, depois de uma breve acomodação no meio do ano, para justificar a decisão. O IPCA-15 de outubro, prévia do indicador oficial, subiu 0,66%, levando o acumulado no ano a 8,49% e o resultado de 12 meses a 9,77%, a maior taxa desde 2002. A alta no mês anterior havia ficado em 0,39%.

Mas o repique da inflação, além de esperado, é apenas um dos fatores de preocupação. Diante das pressões persistentes e do risco de novos problemas, analistas do mercado têm elevado suas projeções para este e para o próximo ano. A mediana das projeções para 2015 chegou a 9,75%. A estimada para 2016 atingiu 6,12% e ficou muito próxima do limite de tolerância, de 6,5%. Também os membros do Copom, dirigentes do BC, se mostram menos otimistas.

A nota distribuída logo depois da reunião, na quarta-feira, diferiu das anteriores em um ponto significativo: o compromisso de levar a inflação à meta de 4,5% até o fim de 2016 foi omitido. A taxa de juros de 14,25% será mantida, segundo o informe, “por tempo suficientemente prolongado” para a “convergência da inflação para a meta no horizonte relevante da política monetária”. Normalmente esse horizonte equivale a dois anos. Acabou a expectativa de uma taxa de 4,5% antes de 2017.

Nesta altura, apostar na convergência para a meta em dois anos também parece arriscado. Apesar disso, é compreensível a insistência dos membros do Copom em definir um prazo para o sucesso de sua política. Num ambiente de tanta insegurança, pelo menos os dirigentes do BC devem mostrar-se, como se têm mostrado há mais de um ano, capazes de fixar um rumo para seu trabalho. Entre agosto de 2011 e abril de 2013, a política monetária adaptou-se à orientação da presidente Dilma Rousseff, defensora de uma redução voluntarista dos juros, e o resultado foi um desastre.

O afrouxamento do combate à inflação agravou os desajustes da economia nacional e, além disso, comprometeu a reputação do BC. A partir daquele momento, em 2013, os condutores da política monetária começaram a trabalhar pela reconstituição de sua imagem, mas com pouco efeito sobre a alta de preços. No ano seguinte o aperto monetário se intensificou, enquanto a política fiscal, já muito fraca, se esboroava, desmoralizada pela insistência na contabilidade criativa e pelas pedaladas.

O rebaixamento da nota de crédito pelas agências de classificação de risco foi apenas um desdobramento de uma longa série de erros e desmandos. A Standard & Poor’s (S&P) já derrubou o crédito oficial do Brasil ao nível especulativo. A Moody’s e a Fitch levaram a nota ao último patamar do grau de investimento, com alto risco de mais uma revisão para baixo. Se mais uma agência seguir o caminho da S&P, o acesso do Brasil ao mercado financeiro internacional ficará bem mais difícil, a fuga de recursos poderá aumentar e a pressão do câmbio, intensificar-se. Nesse quadro, será bem mais difícil de conter a inflação e retomar a expansão econômica.

Enquanto o Copom trabalha solitariamente, a presidente Dilma Rousseff e seus ministros tentam redefinir, no meio de muita confusão e com muito atraso, as metas fiscais para este ano e para 2016. Ainda assim, a presidente hesita na definição dos cortes, como se sobrasse tempo. E há quem reclame dos juros altos, como se fossem um capricho do BC.