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Surpresa no ensino básico

Houve avanço número de alunos com aprendizado adequado em matemática e língua portuguesa nas primeiras séries do ensino fundamental

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Por Redação
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No cenário de descalabro em que se converteu o ensino básico no Brasil, principalmente por causa das graves deficiências da rede pública, causam surpresa os números positivos da última pesquisa feita pelo movimento Todos pela Educação, apontando uma queda expressiva no porcentual de municípios em cujas escolas a 5.ª série do ensino fundamental se encontrava em colapso. Com base na análise dos resultados da Prova Brasil, aplicada em escolas da rede pública pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, o estudo também detectou um aumento significativo, nos últimos dez anos, do número de municípios cujos alunos estão com aprendizado adequado em matemática e em língua portuguesa nas primeiras séries do ensino fundamental. 

Coordenado pela diretora executiva do Todos pela Educação, Priscila Cruz, o estudo mostrou ainda que a 5.ª série desse ciclo de ensino nos municípios desenvolvidos registrou um avanço maior do que nos municípios mais pobres, o que reforça uma correlação conhecida dos especialistas: quanto maior o Produto Interno Bruto per capita, melhor tende a ser a qualidade do ensino. A maior parte dos municípios com baixo desempenho tem um PIB per capita inferior a R$ 10 mil, bem abaixo da média nacional. “Embora tenham sido registrados bons resultados em matéria de melhoria da qualidade de gestão em municípios pobres, como Groaíras (CE) e Brejo Santo (CE), que apresentaram porcentuais de alunos com aprendizado em língua portuguesa e matemática bem acima da média nacional, a pobreza e a desigualdade social são fatores determinantes. Quando olhamos a média da Prova Brasil, metade da proficiência do aluno decorre do que ele aprendeu na vida e a outra metade vem do que aprendeu na escola. A desigualdade social arrasta a educação no Brasil”, diz Priscila Cruz.

Entre os fatores responsáveis pelos avanços registrados na 5.ª série do ensino fundamental, ela destaca a aprovação da Emenda Constitucional n.º 59, em 2009, que tornou obrigatória a matrícula de todas as crianças na faixa etária de 4 a 5 anos no ensino infantil e deu prioridade à alfabetização de crianças, em vez de jovens e adultos. “Antes dessa emenda, havia muitas crianças que chegavam à 1.ª série do ensino fundamental sem ter nunca pisado numa escola”, afirma Priscila. 

Apesar do avanço do desempenho dos estudantes na 5.ª série do ensino fundamental, a pesquisa registrou que a 9.ª série desse ciclo permanece estagnada e que a 3.ª série do ensino médio apresenta um preocupante retrocesso. Na prática, explica a diretora executiva do Todos pela Educação, isso significa que o País venceu a primeira etapa da revolução educacional, na passagem do século 20 para o século 21, universalizando o acesso à escola das novas gerações, mas não conseguiu ultrapassar a segunda etapa, a partir da década de 2000, oferecendo um ensino de qualidade.

“Universalizar a qualidade é um desafio mais complexo, que exige maior esforço e sofisticação da gestão educacional. Políticas gerais para situações e necessidades que são muito distintas já não trazem mais resultados. Cada aluno e cada sala de aula devem ser considerados nas suas especificidades para que todos tenham seu direito de aprendizagem garantido”, afirma Priscila Cruz, apontando o esgotamento do modelo de política educacional em vigor no País. Segundo ela, um dos maiores problemas desse modelo está no fato de que ele propicia aumento do nível de qualidade nos anos iniciais do ensino básico, em que um único professor leciona todas as disciplinas, estagnando-se nos anos seguintes, quando cada disciplina passa a ser ensinada por um professor diferente.

O estudo do Todos pela Educação deixa claro o tamanho do desafio que o País tem de enfrentar para promover uma revolução educacional. Mostra que a trilha a ser seguida exige uma política educacional mais diversificada, capaz de atender às diferentes necessidades de cada município e de cada região.