Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Trump colhe o que planta

A viagem do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a vários países asiáticos ajuda a deixar mais nítidos os efeitos de sua polêmica atuação nos terrenos tanto da economia e do comércio internacional como da diplomacia

Exclusivo para assinantes
Por Redação
2 min de leitura

A viagem do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a vários países asiáticos ajuda a deixar mais nítidos os efeitos de sua polêmica atuação nos terrenos tanto da economia e do comércio internacional como da diplomacia. Não houve até agora, no agitado período de menos de um ano de seu mandato, nenhum desastre, como chegaram a prever seus críticos mais radicais, mas já começam a surgir os primeiros sinais de um recuo da presença de seu país em setores importantes.

Isso ficou particularmente evidente – depois de sua passagem pelo Japão, a Coreia do Sul e a China – durante a reunião de cúpula dos países que integram o Fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec), realizada em Da Nang, no Vietnã. O menos grave no terreno prático, mas que expressa bem algumas das mudanças que vêm ocorrendo na cena internacional, desde que Trump assumiu a liderança dos Estados Unidos, foi o contraste entre as posições adotadas ali por ele e pelo presidente da China, Xi Jinping, que voltaram a se colocar nos lugares opostos aos que normalmente seria de esperar que estivessem.

Como já se tinha visto em algumas outras ocasiões, mas agora de forma mais contundente, Trump assumiu a defesa do protecionismo, com o argumento usado desde sua campanha eleitoral de que deve colocar seu país “sempre em primeiro lugar”, para evitar que outros tirem vantagem dele. “Do mesmo modo que espero que vocês coloquem seus países em primeiro lugar”, acrescentou. Na prática, isso significa a opção por acordos bilaterais de comércio. Os Estados Unidos, garantiu, “não voltarão a entrar em grandes acordos (multilaterais) que amarram suas mãos”.

Em oposição a esse enorme retrocesso, voltou a se colocar Xi Jinping, numa troca de posições impensável há apenas um ano atrás. O líder chinês saiu em defesa do livre-comércio e da globalização – qualificada de “tendência histórica irreversível” –, que deve ser “mais aberta, mais inclusiva, mais balanceada, mais igualitária e beneficiar a todos”. Seu país, garantiu, continuará a seguir uma estratégia de liberdade comercial na área Ásia-Pacífico.

Os tradicionais parceiros comerciais dos Estados Unidos aproveitaram a reunião de Da Nang para dar uma demonstração concreta do caminho que preferem seguir. Onze países da área Ásia-Pacífico – Japão, Canadá, Austrália, Malásia, Vietnã, México, Peru, Brunei, Chile, Nova Zelândia e Cingapura – anunciaram ter acertado as bases para implementar uma nova versão da Parceria Transpacífico (TPP), o grande acordo ao qual os Estados Unidos haviam aderido após longas negociações conduzidas pelo governo Barack Obama, mas do qual Trump logo retirou seu país.

Segundo o ministro de Comércio do Japão, Toshimitsu Motegi, o acerto a que chegou o grupo constitui “uma mensagem positiva e muito forte para os Estados Unidos e outros países da região Ásia-Pacífico”. A resposta a Trump não poderia ter sido mais incisiva: os parceiros que ele abandonou, em vez de se intimidarem – afinal, os Estados Unidos representavam 60% do PIB do grupo –, decidiram dar uma prova de independência, esperando que outros sigam seu caminho, como mostra o novo nome escolhido para o TPP – Acordo Transpacífico Abrangente e Progressista. Para alguns de seus integrantes o êxito da empreitada é de importância vital. É o caso do México, que precisa diversificar seu comércio para enfrentar a ameaça de Trump de romper outro grande acordo, o Nafta, do qual ele participa com os Estados Unidos e o Canadá.

Nos terrenos político e diplomático, Trump não se saiu melhor. Primeiro, disse crer na negativa do presidente russo de que interferiu na eleição americana – como se se pudesse esperar de Vladimir Putin outra resposta a uma tal pergunta – e, pouco depois, voltou atrás e declarou confiar nas agências de inteligência dos Estados Unidos, que concluíram ter havido aquela interferência. Enquanto isso continuou a trocar desaforos publicamente com o presidente da Coreia do Norte, Kim Jong-un.