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Um espetáculo deprimente

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Por Redação
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A Comissão de Constituição e Justiça do Senado promoveu a tão aguardada sabatina do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Mas o espetáculo oferecido esteve longe de honrar as melhores tradições da Casa. Não pelo resultado em si – a recondução de Janot ao cargo –, e sim pelas dez horas de enfado e insultos a que o País foi obrigado a assistir. A sabatina consistiu numa sequência de perguntas irrelevantes, que interessavam mais a quem perguntava, e que pouco esclareciam a respeito de um dos cargos de maior importância institucional nas circunstâncias em que o País se encontra. O único momento de interrupção dessa enfadonha sequência foi ainda pior, quando voltou a se revelar a notória deseducação de Fernando Collor de Mello (PTB-AL).

Janot tinha sido respaldado pela expressiva votação que conquistou na eleição interna do Ministério Público – obteve o apoio de mais de 80% dos votantes – e, assim, encabeçou a lista tríplice enviada à presidente Dilma Rousseff no início do mês. Conforme a praxe, Dilma o indicou para permanecer no cargo de procurador-geral.

A recondução de Janot para mais dois anos de mandato é especialmente importante neste momento, por ser ele o responsável por apresentar ao Supremo Tribunal Federal o pedido para a abertura de processos relativos aos parlamentares acusados de envolvimento no escândalo do petrolão. Por essa razão, a sua recondução foi cercada de ameaças as mais diversas, que partiram especialmente dos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ambos suspeitos de participação no caso revelado pela Operação Lava Jato.

Logo que seu nome apareceu na famosa “lista do Janot”, Renan queixou-se de que o procurador-geral havia cometido “grave e deliberada omissão” ao não lhe permitir “contestar as inverdades levantadas” contra ele. Cunha, por sua vez, foi ainda mais incisivo, ao dizer que Janot o escolhera deliberadamente para ser denunciado, porque o governo estaria interessado em “calar e retaliar” a independência política do presidente da Câmara.

No entanto, como se viu durante a sabatina no Senado, os ânimos se acalmaram. Até demais, pode-se dizer. Os senadores esqueceram que a sabatina de Janot ia muito além das ameaças dos presidentes da Câmara e do Senado ou dos interesses dos senadores investigados no âmbito da Operação Lava Jato. Pela importância do cargo, deviam entrar em pauta na sabatina muitas questões de interesse público nacional. Mas o que se viu foi um longo jogo de amarelinha, no qual – pelo teor das perguntas – era claro qual seria o resultado. No final, foram 26 votos a 1 na comissão e 59 votos a 12, com 1 abstenção, no plenário.

Destoou desse quadro o senador Fernando Collor, que com suas grosserias tem mostrado cada vez mais que faz questão de abandalhar o cargo que ocupa – de senador da República – como fez com o cargo que já ocupou – de presidente da República. Parece não se dar conta de que o País teria direito a ver uma atitude de maior equilíbrio em um senador – qualquer que seja. Ao contrário, vê-se que gosta do papel do menino travesso, que acha que, por se ver contrariado em seus interesses, pode fazer qualquer malcriação. Um triste espetáculo.

Como era lógico, a postura de Collor – sua inflamada e ruidosa indignação – não ajudou a esclarecer muita coisa a respeito do sabatinado. Confirmou-se apenas o que o País está cansado de ver. Alguém que gosta dos holofotes usou seu direito de participar na sabatina como oportunidade de desforra pessoal. Como um arruaceiro de escola, daqueles que prometem pegar seus desafetos na saída, o ex-presidente e senador da República aproveitou o microfone para transformar o sabatinado em réu, disparando perguntas cujo único objetivo era fazê-lo passar vergonha. Depois, como se tivesse 10 anos de idade, ficou a murmurar impropérios contra Janot. Nada mais ilustrativo da imensa crise moral que se abate hoje sobre o Congresso.