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Um estorvo para o meio ambiente

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Por Redação
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A defesa da causa ambiental no governo Lula, já não bastasse ser uma empreitada complicada em razão da identificação do presidente com o desenvolvimentismo a qualquer custo que prevalecia à época em que ele descobriu o mundo, dificilmente poderia estar em mãos menos adequadas. Ao degradar em espalhafato a já reprovável extravagância com que se notabilizou desde os primeiros rumores de sua nomeação para o Ministério do Meio Ambiente, no lugar da demissionária Marina Silva, em maio do ano passado, o ministro Carlos Minc se transformou, para todos os efeitos práticos, em um estorvo para a proteção do patrimônio natural do País contra as pressões dos interesses que formam a chamada coalizão da motosserra. O trato de questões que se entrelaçam numa das mais decisivas agendas nacionais - como a regularização fundiária na Amazônia, a repressão ao desmate, o zoneamento da cana-de-açúcar, o licenciamento para a modernização da malha rodoviária e a reforma do Código Florestal Brasileiro - está sendo desvirtuado pelo comportamento de um ministro egocêntrico e desprovido de senso de medida. Aparentemente determinado a chutar, como se diz, o pau da barraca - por não suportar as servidões do seu cargo e preparando a sua volta para a Assembleia Legislativa fluminense com a auréola de vítima -, Minc se revela uma dádiva para todos quantos queiram desmoralizar, pelo ridículo, as preocupações dos ecologistas. A carnavalização dos problemas, que ele já deixou claro não ter aptidão para enfrentar, é tanto mais deplorável por se fazer acompanhar de uma carga de agressividade verbal que inevitavelmente provoca do lado dos agredidos a clássica reação igual em sentido inverso. O ponto mais baixo a que o ministro desceu - até agora - foi a sua diatribe, na semana passada, contra o agronegócio. Encarapitado em um carro de som, numa passeata da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura em Brasília, ele acusou os grandes produtores rurais, em tom apoplético, de serem "vigaristas". O troco veio do deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), estridente porta-voz da bancada ruralista, que o chamou de "desqualificado moral". Na terça-feira, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), dirigente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), denunciou Minc ao Ministério Público Federal por crime de responsabilidade e à Comissão de Ética Pública do governo por quebra de decoro. Pediu ainda a demissão de Minc, a quem se referiu como "alienado, incompetente e ecoxiita". Também anteontem, na Guatemala, onde se encontrava, o presidente o convocou para uma reunião, hoje. Menos pelo bate-boca com os ruralistas do que por outras caneladas do ministro, dessa vez contra os titulares dos Transportes, Alfredo Nascimento, e de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, criticados publicamente por ele no final da semana. A lista dos colegas que o enfurecem inclui ainda os ministros da Agricultura, de Minas e Energia e a chefe da Casa Civil. Mas, em matéria de barateamento de coisas sérias - no caso, a conduta de autoridades de primeiro escalão do governo da República -, Lula não deixa Minc sozinho em cena. "Tenho muitos filhos, e toda vez que o pai sai de casa a meninada faz algazarra mais do que deveria", permitiu-se comparar. E, mantendo o nível, emendou: "Imagina, no campo de futebol, se os jogadores começam a se xingar alto pra torcida ouvir, pra imprensa descobrir, acaba o jogo." Minc, de todo modo, se vangloria de que, a depender de Lula, o seu espetáculo vai prosseguir. "Ele já resolveu", bravateou. "Fico até o fim do governo." É impossível subestimar os efeitos desse circo para a condução equilibrada das tensões entre a expansão das atividades econômicas e os imperativos ambientais. Estão na ordem do dia conceitos - e interesses. Numa frente crucial para o País, a do comércio exterior, a carta verde tem sido cada vez mais jogada para restringir a competição. Dias atrás, por exemplo, o ex-presidente Bill Clinton, numa palestra em São Paulo, a convite, aliás, do setor sucroalcooleiro, desafiou o Brasil a provar que não desmata a Amazônia se quiser conquistar mercado para o biocombustível nacional. O ministro Carlos Minc está claramente aquém do problema.