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Um fiasco em números

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Por Redação
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Com a pífia expansão de 0,9%, o Brasil teve no ano passado um desempenho econômico bem pior que o dos Estados Unidos, um país em crise, e muito inferior ao da maior parte do mundo em desenvolvimento. A economia americana avançou 2,2%, apesar das dificuldades políticas enfrentadas pelo governo. Emergentes mais ligados ao mercado internacional e mais sujeitos a choques externos fecharam 2012 com resultados satisfatórios. A Rússia cresceu 3.4%; a Índia, 5%; o México, 3,9%; e o Peru, 6,3%. A China, apesar de alguma retração, ainda se expandiu 7,8%. Além disso, o Brasil acumulou crescimento de apenas 3,6% no primeiro biênio da presidente Dilma Rousseff. Mais que um fiasco ocasional, essa estagnação é um claro indício de graves problemas estruturais.Alguns desses problemas ficam evidentes quando se examinam detalhes das contas nacionais divulgadas na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O mais sério - o baixo nível de investimento - tornou-se mais preocupante no ano passado. O valor aplicado em máquinas, equipamentos, construções civis e obras de infraestrutura foi 4% menor que o do ano anterior. A comparação do total investido com o tamanho da economia torna mais fácil perceber o retrocesso. A proporção entre o investimento e o Produto Interno Bruto (PIB) caiu de 19,3% em 2011 para 18,1% no ano passado. O País precisaria investir uns 25% do PIB para crescer com segurança em ritmo igual ou pouco superior a 5% ao ano. Essa proporção tem sido apontada por muitos economistas e foi repetida nessa semana pela presidente Dilma Rousseff, em Brasília, durante encontro com empresários. Para este ano, o governo provavelmente já ficará muito satisfeito se o investimento chegar a um nível próximo de 20% do PIB. Para isso o País dependerá tanto de recursos externos como de um aumento da poupança interna. No ano passado o Brasil precisou de uma participação maior do capital estrangeiro, porque a poupança gerada internamente, de 14,8% do PIB, ficou bem abaixo da alcançada em 2011 (17,2%). Essa evolução foi certamente determinada pela piora das finanças públicas. Mais uma vez a economia foi puxada, em seu escasso crescimento, pelos gastos de consumo. Com expansão de 3,1%, o consumo das famílias cresceu pelo nono ano consecutivo. Segundo o relatório divulgado pelo IBGE, esses gastos foram sustentados pela evolução de 6,7% da massa de salários e pelo aumento do crédito. O saldo nominal dos financiamentos com recursos livres a pessoas físicas elevou-se 14%. A explicação teria sido mais completa se incluísse os incentivos fiscais concedidos a alguns setores, como o automobilístico e o de produtos domésticos da linha branca. Ao mesmo tempo, o consumo da administração pública avançou 3,2%. Esse item corresponde ao custo de produção dos serviços total ou parcialmente gratuitos prestados por todos os níveis de governo. Houve, como em 2011, um forte descompasso entre a demanda de consumo e a capacidade de oferta interna. O volume produzido pela indústria de transformação foi 2,5% menor que o de 2011. Essa diferença acabou refletida, em boa parte, nos índices de preços. O governo atribui a inflação, principalmente, ao encarecimento de algumas commodities, com destaque para os produtos agrícolas. Mas o fenômeno foi certamente mais amplo. Os aumentos de preços foram disseminados, atingiram a maior parte dos setores e foram favorecidos por uma demanda muito mais forte que a produção. Nos últimos dois anos, o governo tentou reativar a economia principalmente por meio de estímulos ao consumo - redução de tributos sobre certos bens e aumento do crédito. Ações a favor da produção e da competitividade foram escassas e só recentemente ganharam destaque na agenda oficial. Hoje o governo corre atrás de investidores estrangeiros e nacionais para enormes programas de infraestrutura. Mas é preciso reconquistar a confiança, prejudicada por intervenções desastradas na área de petróleo e por outros erros, cometidos, por exemplo, em relação a empresas do setor elétrico e dos serviços portuários.