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Um governo travado

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Por Redação
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De tropeço em tropeço, o governo chegou ao fim de novembro forçado a escolher entre a quase paralisia – com interrupção de todos os gastos discricionários e, portanto, de todas as obras – e o risco de violar a Lei de Responsabilidade Fiscal por descumprimento da meta fixada para 2015. O Executivo pediu ao Congresso autorização para fechar o ano com um déficit de até R$ 119,9 bilhões nas contas primárias, isto é, sem considerar os juros da dívida pública. Mas esse projeto ainda estava na fila para apreciação, na sexta-feira, e a meta em vigor, portanto, era a anterior, um superávit primário de R$ 55,3 bilhões. Com as contas já esburacadas e sem a esperança de um repentino e milagroso ingresso de recursos, a administração federal teria de podar R$ 107 bilhões de suas despesas, de acordo com os cálculos divulgados em Brasília.

Qualquer decisão – paralisar os gastos ou assumir o risco de uma ilegalidade – teria de ser urgente. Na segunda-feira, o governo precisaria emitir o último decreto de programação financeira para 2015. O presidente do Senado, Renan Calheiros, havia marcado só para terça-feira a votação da nova meta proposta para o ano.

Mas até a decisão mais dolorosa, defendida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, seria insuficiente para produzir o resultado necessário. O corte máximo poderia ser de uns R$ 10,7 bilhões e ainda havia desacordo sobre a decisão entre os ministros econômicos.

O governo federal está acostumado a restringir despesas por limitação legal. O Congresso deveria aprovar a proposta de lei orçamentária até dezembro de cada ano, mas tem descumprido esse prazo com frequência. Quando isso ocorre, a administração só pode realizar certas despesas consideradas indispensáveis, como o pagamento de pessoal, até dispor de um Orçamento sacramentado pelos congressistas. Mas na última sexta-feira o Executivo enfrentou uma situação um tanto diferente e bem mais complicada, porque estava envolvida a entrega de um resultado fiscal inalcançável.

Nesse caso, o responsável pelo problema é mesmo o Executivo. Os ministros da Fazenda e do Planejamento divergem sobre a gestão das contas públicas, e a presidente da República, Dilma Rousseff, tem sido incapaz de exercer uma liderança consequente. Mais de uma vez apoiou o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, sem pesar adequadamente o custo da decisão.

Numa dessas ocasiões, o governo acabou entregando ao Congresso um projeto de Orçamento para 2016 com déficit primário. Um dos efeitos dessa imprudência foi o rebaixamento do Brasil, pela Standard & Poor’s, ao grau especulativo. Em desacordo frequente, sem liderança presidencial e sem adequada articulação com o Congresso, a impropriamente chamada equipe econômica tem sido incapaz de formular e de executar medidas de ajuste com a clareza e a rapidez necessárias. O projeto de Orçamento para 2016 continua em tramitação, com muitas dúvidas sobre as fontes de receitas, e na última sexta-feira até a nova meta fiscal deste ano continuava na fila de apreciação pelos congressistas.

A incapacidade de ação demonstrada pelo governo seria muito ruim para a economia nacional em qualquer circunstância. Num período de recessão, desemprego e inflação elevada, é catastrófica. De janeiro a outubro o governo central – Tesouro, Previdência e Banco Central – acumulou déficit primário de R$ 33,1 bilhões, 169,6% maior que o de um ano antes, descontada a inflação. A receita líquida total foi 5,6% menor que a de igual período de 2014, também descontada a inflação. A despesa também diminuiu, mas em proporção menor: 3,3%. O resultado positivo do Tesouro, R$ 41,48 bilhões, ficou longe do necessário para compensar o déficit da Previdência, R$ 74,06 bilhões.

Também se espera recessão no próximo ano, mas o governo mantém a promessa de superávit primário em 2016. Não se sabe como entregará esse resultado nem como fechará 2015. Certas, mesmo, só a baderna do governo e a incapacidade de liderança da presidente Dilma Rousseff.