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Um orçamento para ser podado

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Por Redação
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Aprovado o Orçamento, o governo tem o caminho livre para programar o corte de gastos necessário à arrumação das contas públicas - condição para o Brasil recobrar a confiança dos investidores, sair do atoleiro econômico e voltar a crescer. O primeiro passo será o anúncio de um contingenciamento, parte do ritual de administração financeira da União. Esse passo só é possível depois de aprovada pelo Congresso e sancionada pela chefia de governo a proposta de lei orçamentária. Em condições normais, pode haver liberação, nos meses seguintes, das verbas contingenciadas, se a receita fiscal permitir os gastos. Neste ano, essa hipótese é muito improvável. Se nenhum fato positivo e muito inesperado ocorrer, o Tesouro deverá manter o represamento até o fim do ano.O corte, segundo estimam especialistas do mercado e insinuam fontes de Brasília, poderá ficar próximo de R$ 80 bilhões. Além disso, o governo planeja elevar a receita por meio da redução de estímulos fiscais e financeiros em vigor nos últimos anos. Esses incentivos consistiram essencialmente em remendos tributários. Foram úteis a alguns segmentos da indústria, mas inúteis como alavancas do investimento produtivo e do crescimento econômico. A herança dessa política, associada à gastança e a uma inflação bem acima dos padrões internacionais, é uma economia atolada. Especialistas nacionais e internacionais projetam para este ano uma redução do Produto Interno Bruto (PIB). Tudo indica, de toda forma, um ritmo de atividade suficiente apenas para proporcionar ao Tesouro uma arrecadação muito magra.Apesar das dificuldades, o governo mantém o compromisso de alcançar um superávit primário de R$ 66,3 bilhões, destinado ao pagamento de juros da dívida pública. A promessa é elevar a meta em 2016. Os primeiros passos para o ajuste em 2015 foram dados, mas parte dos ajustes dependerá de apoio no Congresso. Empresários e sindicalistas têm criticado as mudanças propostas - na política de desoneração da folha de pessoal e nas condições de acesso ao salário-desemprego, por exemplo. Há petistas e aliados contrários à política de austeridade. Oposicionistas estão desconfortáveis. Para falar contra o governo, têm de renegar o próprio discurso favorável à seriedade fiscal.O desapego dos congressistas ao uso eficiente do dinheiro público foi evidenciado, de novo, na forma final do Orçamento aprovado com quase três meses de atraso.Além de acolher emendas individuais no valor de R$ 9,7 bilhões apresentadas no ano passado, o relator do projeto, senador Romero Jucá, abriu espaço para os novos parlamentares também acrescentarem penduricalhos. Isso resultou em mais R$ 2,67 bilhões de gastos. As contribuições dos parlamentares são, em geral, emendas de interesse paroquial, destinadas a agradar a clientelas eleitorais. Têm pouco ou nenhum valor como itens de uma política nacional.O relator também foi generoso com os partidos, multiplicando por três - para R$ 867,5 milhões - as verbas destinadas ao Fundo Partidário. Aumentos para engordar esse fundo têm ocorrido todo ano, mas desta vez as pressões foram mais fortes. O aumento do número de partidos diminuiu as fatias destinadas às maiores legendas. Além disso, a Operação Lava Jato, sobre a bandalheira na Petrobrás, afugentou doadores, como informaram fontes partidárias ao Broadcast Político, serviço online da Agência Estado.No mesmo dia o Congresso promulgou a Emenda Constitucional 86, instituindo a figura do Orçamento impositivo. Com isso, o governo fica obrigado a liberar para emendas verbas equivalentes a até 1,2% da receita corrente líquida do ano anterior e perde um instrumento de barganha. Seria um ganho para a democracia, num país onde os congressistas fossem mais ciosos de seu papel. Mas nesse país o Orçamento seria, muito mais frequentemente que no Brasil, aprovado antes de suas excelências entrarem em férias. Na prática, a nova regra torna um pouco mais difícil controlar e racionalizar o gasto público.