04 de julho de 2011 | 00h00
Coragem, clareza e simplicidade nas ações políticas marcaram sua passagem pela Presidência. Ao iniciar o mandato, pediu a demissão de todos os ministros e recompôs o primeiro escalão segundo seu julgamento. Em 1993 entregou o Ministério da Fazenda a um sociólogo famoso, com passagem pelo Senado e pelo Itamaraty, mas nenhuma experiência na administração econômica. Foi o primeiro passo para a elaboração do Plano Real, o controle da moeda e a reforma das finanças públicas.
Itamar levou para a chefia da Casa Civil um respeitado funcionário da Câmara dos Deputados, Henrique Hargreaves. Acusado de irregularidades, Hargreaves deixou o cargo, em acordo com o presidente, para melhor se defender. Inocentado, reassumiu o posto. O exemplo dado por Itamar nesse episódio foi muito lembrado nos últimos oito anos quando figuras importantes do governo foram envolvidas em grandes escândalos. Mas não foi seguido. Se alguém se afastou ou foi demitido, foi só quando sua posição se tornou insustentável e perigosa para seu chefe.
Em sua última passagem pelo Senado, o ex-presidente manteve suas características bem conhecidas. Marcou presença nas atividades rotineiras do Congresso de modo firme, claro e minucioso. "Suas questões de ordem, formuladas com segura obstinação, causavam furor. Sem ele, o dia a dia do Senado - perdoem-me os colegas - fica mais banal", comentou o senador Aloysio Nunes Ferreira. Esse retalho de memória descreve com precisão o comportamento habitual de Itamar Franco.
As mesmas qualidades tornaram Itamar Franco admirável e o expuseram a críticas. Sua determinação se expressou ora como firmeza, ora como teimosia. Nem todos concordaram com seu nacionalismo às vezes fora de propósito e exacerbado. Em janeiro de 1999, em meio a grave crise cambial, Itamar, governador de Minas, declarou moratória da dívida estadual, complicando uma situação nacional já muito difícil.
Como outros ex-presidentes, Itamar permaneceu no dia a dia da política, em vez de se afastar e assumir um lugar no panteão de quem já passou pelo posto mais alto do País. Poucos teriam, tanto quanto ele, as condições morais para o papel de conselheiro e de servidor suprapartidário, reservado para funções de interesse do Estado. Mas ele permaneceu na arena política, disputou indicações, mudou de partido e não parou sequer depois de completar o mandato de governador de Minas. O Brasil, é justo reconhecer, não perdeu com isso. Ao contrário, pôde beneficiar-se de sua teimosia e de sua lisura ainda por alguns anos.
O Brasil é hoje certamente melhor do que era antes de Itamar Franco exercer a Presidência da República. A vitória contra a inflação fortaleceu a economia, abriu caminho para a redução das desigualdades e estabeleceu as bases para o crescimento seguro. Tudo isso mudou a imagem externa do Brasil e elevou o autorrespeito dos brasileiros. Os passos decisivos dessa enorme transformação foram dados em apenas dois anos, num ambiente extremamente desfavorável. Haver governado o Brasil nesse período extraordinário bastaria para construir a reputação de qualquer pessoa. Mas Itamar Franco ainda se distinguiu por algo mais: terminou a carreira de homem público teimoso, determinado e briguento sem uma única mancha em sua reputação.
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